segunda-feira, 14 de janeiro de 2008

Rumo ao "Capitalismo total" ?



Um novo tipo de ensino, desprovido de senso crítico, forma indivíduos inconstantes e indecisos, receptivos a quaisquer pressões de consumo. Os professores dessa escola deverão ser reeducados sob o comando de especialistas em pedagogia

Por: Dany-Robert Dufour

O neoliberalismo não visa apenas à destruição das instâncias coletivas construídas ao longo do tempo (família, sindicatos, partidos e, de uma maneira mais geral, a cultura), mas também à da forma indivíduo-sujeito surgida durante o período moderno(1).
A fábrica do novo sujeito “pós-moderno”, não-crítico e “psicotizante”, resulta de um projeto perigosamente eficiente, no centro do qual se encontram duas importantes instituições que se dedicam devotadamente à sua execução: a televisão e uma nova escola, sensivelmente alterada por trinta anos das chamadas reformas “democráticas” – que sempre operaram no sentido de enfraquecer a função crítica.
O embrutecimento das crianças pela televisão começa muito cedo. Quando chegam à escola, já vêm empanturradas da telinha desde a mais tenra idade. O fato de se verem diante de um televisor antes de falarem é novo, do ponto de vista antropológico. O consumo de imagens chega a cinco horas por dia, nos Estados Unidos.


O colapso do universo simbólico


A inundação do espaço familiar por essa torneira permanentemente aberta, de onde escorre um fluxo ininterrupto de imagens, tem efeitos consideráveis na formação do futuro sujeito. É comum questionar-se o conteúdo mesmo das imagens, denunciando, por exemplo, a sua violência, sem se ter consciência de que o próprio veículo pode ser perigoso, transmita ele o que transmitir. Aliás, entre os contos infantis contados pelas vovós de antigamente havia inúmeros
ogros devoradores de criancinhas que nada deixam a desejar às imagens gore atualmente transmitidas. Mas não se pode deixar de levar em consideração a diferença entre o universo nitidamente imaginário do ogro do conto – obrigando a criança a pensá-lo como outro mundo (o da ficção) – e o universo muito realista dos seriados com violência, estupro e assassinato, sem se distanciar do mundo real. É claro que a televisão, pelo lugar preponderante ocupado por uma
publicidade onipresente e agressiva, constitui uma autêntica submissão precoce ao consumo. Mas, voltando à mesma tecla: a questão não está somente no conteúdo das imagens, mas também na própria forma.
Em primeiro lugar, com a televisão, é a família – enquanto meio de transmissão entre gerações e cultural – que é reduzida a sua mínima expressão. O termo “filhos da televisão”, tomado ao pé da letra, revela que a televisão efetivamente seqüestrou a função educativa dos pais junto aos filhos. Essa redução de tempo para a transmissão entre gerações produz efeitos bastante nítidos, podendo chegar ao colapso do universo simbólico e psíquico.


O acesso à função simbólica


O universo simbólico refere-se à capacidade essencial que distingue o homem dos animais: a de falar, identificando-se a si próprio como sujeito falante e dirigindo-se a seus semelhantes a partir dessa referência, enviando-lhes sinais que supostamente representam alguma coisa. Para ter acesso à função simbólica, basta fazer seu, integrando-o, um sistema onde o “eu” (presente) fala a “você” (co-presente) sobre “ele” (o ausente, ou seja, alguém ou alguma coisa que se trata de re-presentar) (2). Essas referências simbólicas fundamentais permitem as distinções básicas entre o eu e o outro, o aqui e o ali, o antes e o depois, a presença e a ausência.
Ao garantir o acesso à função simbólica e a uma certa integridade psíquica, esse sistema transmite-se essencialmente por intermédio do discurso: os pais falando à criança. Falar significa transmitir relatos, crenças, nomes próprios, genealogias, ritos, obrigações, saberes, relações sociais... mas, antes de tudo, a própria palavra. Significa transmitir de uma geração à outra a aptidão humana de falar, de forma a que a pessoa a quem se fala possa, por sua vez, identificar-se no tempo (agora), no espaço (aqui), como si (eu) e, a partir dessas referências, convocar em seu discurso o resto do mundo. O discurso oral frente-a-frente institui a faculdade de falar em registro duplo: o discurso é sonoro ou gestual e transporta imagens mentais – quando o outro me fala, vejo o que ele quer dizer. É essa transmissão entre gerações do discurso que a televisão pode ameaçar.


Confundindo o universo simbólico


Caso as referências simbólicas de tempo, de espaço e de pessoa não estejam bem fixas, a imagem externa torna-se uma espécie de conexão mais ou menos ligada às imagens internas – ou fantasmas – que assombram o aparelho psíquico e cuja chave é desconhecida, inclusive, de quem a tem em seu poder.
As imagens podem, portanto, agredir quem as vê, sem se fixar nem se encadear, num processo cumulativo controlável, colocando o sujeito sob sua dependência.
Nesse caso, o uso da televisão ameaça afastar ainda mais o sujeito do controle das categorias simbólicas de espaço, tempo e pessoa. Ela mistura sua percepção, aumenta a confusão simbólica e fúrias fantasmagóricas. É, então, a capacidade discursiva do sujeito que é questionada.
Não somente o uso da televisão é incapaz de suprir as insuficiências na simbolização, o que se poderia ingenuamente ser levado a crer, como pode confundir ainda mais os acessos a ela(3). Esta observação é válida para qualquer prótese sensorial: não apenas para a tele-visão, mas qualquer outra forma de tele-mática que envolva a tele-presença, ou seja, tudo o que transporte um “aqui” para “lá” e um “lá” para “aqui”: vídeo games, telefones celulares – que as
pessoas passaram a usar 24 horas por dia –, Internet... Percebem-se, por toda parte, os riscos de decuplicar as competências de umas pessoas e de aumentar a confusão de outras. Alguns sujeitos chegam a tornar-se seres quase emancipados das obrigações espaço-temporais, enquanto outros perdem a noção de viver em qualquer espaço-tempo.


O ensino, uma “tendência arcaica”


São basicamente os “filhos da televisão” que se encontram hoje na escola. É fácil, portanto, compreender a razão pela qual inúmeros professores são levados à amarga constatação de que as crianças que ali estão “já não são alunos”, “já não ouvem (4)”. E, provavelmente, já não falam. Não porque se tenham tornado mudos, muito pelo contrário: mas enfrentam uma enorme dificuldade em se integrar à seqüência do discurso que distribui, de forma alternada, cada um a
seu lugar: aquele que fala, aquele que escuta. Não conseguem penetrar no discurso que, na escola, permite a uma pessoa (o professor) propor questões baseadas na razão (ou seja, num saber múltiplo, acumulado ao longo das gerações anteriores e permanentemente reatualizado), e à outra pessoa (o aluno) discuti-las da forma que lhe aprouver.
É evidente que um bom número de professores não poupa esforços e se desgasta, às vezes de maneira excessiva(5), para tentar fazer com que os jovens entrem em sua posição de aluno, de forma a que, também eles, possam desempenhar seu ofício de professor. E eis aí a novidade: como os alunos foram impedidos de se tornarem alunos, os professores são, cada vez mais, impedidos de exercer a sua profissão. Após trinta anos das chamadas reformas “democráticas”, dirigentes políticos e especialistas em pedagogia não se cansam de lhes dizer que deveriam desistir de sua pretensão arcaica de ensinar. Claude Allègre, por exemplo, ex-ministro da Educação, advertia os professores, dizendo-lhes que deveriam desistir de sua “tendência arcaica” e dar-lhe ouvidos: “Basta ouvirem o que eu digo. Eu sei do que falo.” E, no lugar do termo “aluno”, introduzia uma nova categoria, “os jovens”, dos quais dizia: “O que os jovens
querem é inter-reagir(6).”


A violência na escola


Em nome da democracia na escola, ratifica-se, dessa forma, o fato de que já não existem alunos. Para que serviriam, então, os professores? Nos discursos dos dirigentes e dos especialistas em pedagogia, o modelo educacional que prevalece, em oposição a esse suposto “arcaísmo”, acaba sendo o do talk show televisivo, em que cada participante pode, “democraticamente”, opinar. Tudo se torna, portanto, uma coisa intersubjetiva. Acaba-se o esforço crítico necessário à reversão do próprio ponto de vista, para ter acesso a outras questões, um pouco menos estreitas, menos falaciosas e melhor construídas. O que se tornou intolerável é o fato de que o professor é que conduz, que empurra constantemente os alunos na direção da função crítica. É ele que deve ser abatido, pois ele não respeita a opinião do “jovem”. Vários especialistas em pedagogia “explicam” a violência na escola de seguinte forma: os “jovens” estariam reagindo à autoridade indevida dos professores.
Se são obrigados a recorrer à violência e submetidos a uma relação de força, isso é porque não lhes foi possível qualquer outra alternativa: foram produzidos para escapar à relação de sentido e a paciente elaboração discursiva e crítica. Nesse sentido, não é difícil prever – inversamente ao processo pedagogista que acusa o professor de violência – que quanto menos participarem da relação professor-aluno, mais os alunos estarão sujeitos à violência.


Fabricando imbecis e trapaceiros?


Com o abandono da relação de sentido e a eclosão da relação de força, o que acaba prevalecendo é, nada mais, nada menos que a “escola do capitalismo total”, segundo Jean-Claude Michéa(7). Ou seja: uma escola que, desprovida de senso crítico, forme indivíduos inconstantes e indecisos, receptivos a quaisquer pressões de consumo. Nessa escola de massa “a ignorância será ensinada de todas as maneiras concebíveis”. Os professores deverão, pois, ser reeducados sob o comando dos especialistas em pedagogia, que lhes mostrarão a desnecessidade de ensinar para passar a confiar exclusivamente nos sentimentos do momento e em sua vitoriosa gestão. Trata-se, portanto, de impor as condições, segundo Michéa, de uma “dissolução da lógica”: deixar de distinguir o importante do secundário, aceitar de forma impassível uma coisa e o seu oposto...
Na própria universidade, por exemplo, há uma corrente pedagógica que se insurge, recusando-se a pedir aos “jovens” que pensem. Seria o caso de distrai-los, diverti-los, deixá-los à vontade, brincando “democraticamente” com seus controles remotos segundo a vontade de suas inter-ações, fazê-los contarem suas vidas, mostrar-lhes que os conhecimentos da lógica não passam de abusos de poder. Trata-se, principalmente, de demonstrar que não há o que pensar, que não há objeto de reflexão: tudo se resumiria à afirmação de si e a uma gestão relacional da afirmação de si que conviria saber defender, como sabe fazer qualquer consumidor que se preze. Será que se trataria de fabricar imbecis trapaceiros, adaptados ao consumo?


A exceção das elites


É provável que os pedagogos não queiram isso: só querem adaptar-se ao estado em que encontram os “jovens” na escola. Ao fazê-lo, em nome da compaixão, contribuem para agravar a situação e para destruir ainda mais a escola. Esse uso dos serviços dos pedagogos fornece mais um exemplo da forma pela qual o neoliberalismo soube aproveitar-se, em seu favor, dos esquemas libertários da década de 60(8).
As instituições de ensino, inclusive a universidade, passam, portanto, a receber populações hesitantes, cuja relação com o saber se tornou uma preocupação bastante acessória. Um novo tipo de instituição, fluida – cuja pós-modernidade detém o segredo, a meio-caminho entre casa da juventude e da cultura, entre hospital e abrigo social, semelhante a esses parques de interesse escolar – está em vias de surgir. Não exclui certas zonas residuais de produção e reprodução do saber, onde novas tecnologias são chamadas para os papéis principais (“As tarefas repetitivas do professor serão todas gravadas e arquivadas”, prometia alegremente o ex-ministro na entrevista já citada). No meio tempo, a formação e reprodução das elites (outra função primordial da “escola do capitalismo total”) serão, cada vez mais, exclusivamente garantidas pelas “Grandes Escolas” e similares, ou, de preferência, pelas melhores escolas e universidades privadas norte-americanas (com despesas de escolaridade que chegam a 30 mil dólares por ano). Essas instituições, que continuam funcionando segundo um rigoroso modelo crítico, não são de forma alguma objeto do questionamento dos pedagogos, o qual se destina às massas. A fábrica de indivíduos desprovidos da função crítica e passíveis de uma identidade inconstante e hesitante não é, portanto, obra do acaso: ela é perfeitamente assumida pela televisão e pelas escolas atuais. O sonho do capitalismo não é apenas o de levar o território da mercadoria aos confins do mundo (o que já ocorre, sob o nome de globalização) – transformando tudo em objeto de comércio (direitos sobre a água, o genoma, as espécies vivas, a compra e venda de crianças, de órgãos...) – mas também o de trazer os velhos assuntos privados, que até agora eram da alçada individual (subjetivação, sexuação...) para o âmbito da mercadoria. Desse ponto de vista, vivemos hoje um momento crucial, pois se a forma sujeito for atingida, já não serão somente as instituições que temos em comum que estarão ameaçadas, mas também, e principalmente, o que nós somos. E então, nada mais conseguirá conter um capitalismo total em que tudo, sem exceção, fará parte do universo mercantil: a natureza, os seres vivos e o imaginário.


(Trad.: Jô Amado)


1 - Ler, de Dany-Robert Dufour, “As angústias do indivíduo-sujeito”, Le Monde diplomatique, fevereiro de 2001. A modernidade, segundo o grande historiador Fernand Braudel, nasce “em algum lugar, entre 1400 e 1800”: é, portanto, contemporânea do capitalismo.


2 - Ler, de Dany-Robert Dufour, Les mystères de la trinité, ed. Gallimard, Paris, 1990.


3 - Um filme de 1993, Benny’s vídeo, de Michale Haneke, dá uma idéia, bastante eloqüente e assustadora, do que poderia ser essa confusão. Trata-se de um adolescente que mantém com seus pais relações estritamente funcionais e que se relaciona com o mundo exclusivamente por meio das telas de vídeo. Quando uma pequena parte desse mundo surge diante de si (uma garota), ele reage de uma forma completamente escabrosa (um crime, no caso).


4 - Ler, de Adrien Barrot, L’enseignement mis à mort, ed. Librio, Paris, 2000.


5 - Exemplo disso são os inúmeros casos de “depressão pelo ensino”, que o ex-ministro Claude Allègre dizia tratarem-se de um abuso de licenças médicas.


6 - Le Monde, 24 de novembro de 1999.


7 - Ler, de Jean-Claude Michéa, L’Enseignement de l’ignorance, ed. Climats, Castelnau, 1999.


8 - Sobre a integração da contestação anarquista ao neoliberalismo, ler, de Luc Boltanski e Eve Chiapello, Le Nouvel esprit du capitalisme, ed. Gallimard, Paris, 1999. Ler também, de Serge Halimi, “A nossa utopia e a deles”, Le Monde diplomatique, abril de 2001.


Fonte: http://www.ensp.fiocruz.br/informe/anexos/Dufour_03.pdf

O simbolismo em Cornelius Castoriadis


"Por mais que encontremos na história uma autonomização do simbolismo, esta não é um fato último, e não se explica por si própria. Existe um utilização imediata do simbólico, onde o sujeito pode se deixar dominar por este, mas existe também uma utilização lúcida ou refletida. Mesmo se esta última nunca pode ser garantida a priori (não se pode construir uma linguagem, nem mesmo um algorítmo, no interior do qual o erro seja "mecanicamente" impossível), ela se realiza, mostrando assim a via e a possibilidade de uma outra relação onde o simbólico não é mais autonomizado e pode adequar-se ao conteúdo. Uma coisa é dizer que não podemos escolher uma linguagem em uma liberdade absoluta, e que cada linguagem se apodera do que "deve ser dito". Outra coisa é acreditar que somos fatalmente dominados pela linguagem e que só podemos dizer o que ela nos leva a dizer. Não podemos jamais sair da linguagem, mas nossa mobilidade na linguagem não tem limites e nos permite tudo questionar, inclusive a própria linguagem e nossa relação com ela. O mesmo ocorre em relação ao simbolismo institucional - exceto evidentemente que o grau de complexidade é neste caso incomparavelmente mais elevado. Nada do que pertence propriamente ao simbólico impõe fatalmente o domínio de um simbolismo autonomizado das instituições sobre a vida social; nada, no próprio simbolismo institucional, exclui seu uso lúcido pela sociedade - sendo também neste caso evidente que não é possível conceber instituições que impeçam "por construção", "mecanicamente" a sujeição da sociedade ao seu simbolismo."
(In, A Instituição Imaginária da Sociedade, pags.152/153)

A Internet está cada vez mais centralizada



(reportagem de Pedro Doria e publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo, 14-01-2007.)


O discurso é estupendo - mas a realidade o derruba.

Basta ver alguns dos números levantados por Nicholas Carr, escritor especializado em tecnologia e 'crítico cultural' destes nossos tempos digitais. O número de websites no mundo dobrou entre 2002 e 2006 - e tende mesmo a continuar aumentando bastante. Mas só porque há mais sites na web para visitar, não quer dizer que mais sites sejam visitados.

Em 2002, 31% do tráfego de dados em toda web era dominado pelos 10 sites mais populares da rede. Em 2006, os dez sites mais populares atraíam 40% do tráfego. Não é pouco, então não custa frisar: 40% de todo acesso à web está voltado para apenas dez sites.

Um destes sites, evidentemente, é o Google, sistema de buscas que todos usamos. Em 2006, 58% de todas as pesquisas feitas na web foram via Google. Agora em novembro passado, o Google abocanhava 65% de todas as pesquisas.

Se alguém me perguntasse quantas pesquisas faço diariamente usando o Google, não saberia responder. O meu não é um exemplo único - é típico. Todos que acessam diária e continuamente o Google conhecem já os vícios do site. Como, por exemplo, o hábito de listar ali dentre as primeiras respostas algum verbete da Wikipédia.

A tese de Carr é esta: a web está ficando centralizada. E, sim, o Google é um dos responsáveis.

Talvez seja mesmo inevitável. Como o critério usado pelo Google para decidir a relevância de um site é o número de visitas, quanto mais visitado, mais acima na lista de respostas ele aparece. Quanto mais acima ele aparecer, mais clicado ele será e, portanto, mais visitado. Forma-se um ciclo vicioso.

Outro dos motivos da centralização é o modelo econômico de micropagamentos que começa a imperar na rede. Se um anúncio paga pelo número de vezes que ele é exibido, a maneira de apresentar muitos anúncios a muita gente é concentrar muito conteúdo. Daí que grandes portais compram muitos sites: seu objetivo é atrair o maior número possível de visitantes. Evidente. Mas o resultado é um novo ciclo vicioso no qual quem mais acumula dinheiro na rede é quem tem mais conteúdo para exibir e que, portanto, mais dinheiro para investir em novos sites terá.

A concentração é também física. Grandes grupos como Yahoo!, Microsoft e o próprio Google, por atraírem uma quantidade desproporcional de usuários, precisam de conexões à rede extremamente poderosas e grandes parques de servidores que ninguém mais tem.

Aquele modelo inicial de internet no qual cada ponto da rede seria tão importante quanto qualquer outro se foi no mundo prático. Até fisicamente a internet é centralizada.

Carr é um crítico ácido da utopia eletrônica. Em 2006, ele apostou com o israelense Yochai Benkler a respeito de como será a internet em 2010. Para Benkler, esta centralização pode estar acontecendo, mas os dez sites mais visitados da rede serão colaborativos. Quer dizer: Wikipédias, Blogspots da vida, grandes portais onde todo o publicado virá pelas mãos do grande público anônimo que povoa o mundo digital.

Carr não tem dúvidas de que o mundo da internet será centralizado e que os dez mais lidos serão sites tradicionais, talvez de grandes empresas de mídia, mas sempre com gente paga para produzir conteúdo.

Esta é, afinal de contas, a grande aposta em curso na internet.
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Comentário de jholland, 14/01/2008, 23h03
Ontem tive uma segunda conversa com o Guilherme sobre um assunto correlato: o "sistema" está mais (ou menos) fascista ? É muito mais fácil e evidente demonstrar o caráter de fechamento ideológico.Está na tradição da nossa filosofia, é quase um senso-comum etc. Entretanto, tenho-me dedicado a visualizar o "outro lado", mais anárquico, digamos, do mesmo sistema, do mesmíssimo cotidiano. De uma certa forma, é como se a ideologia e o sistema simbólico fossem uma espécie de "Janus": de uma lado, fascista, e assim se apresenta para a maioria das pessoas; mas, de outro, para aqueles que conseguiram se "despregar" (ou desapegar), esse mesmo sistema apresenta inúmeras e variadas possibilidades, oferecendo sua face anárquica. É nesse sentido que apresentei o texto do Castoriadis, acima...
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Comentário de u.s.w, 15/01/2008, 06h51
São alguns os pontos que gostaria de destacar.
De fato, cada vez mais acredito que o mundo, com seus sistemas (econômicos, simbólicos etc.), seja Janus. Quero dizer com isso que vemos e sentimos o mundo de acordo com a postura que assumimos perante ele. Numa conversa com um professor da UFRJ cujo o tema de trabalho é o papel das mídias na construção de estados mentais "felizes" e cujos os pés estão imersos no hinduismo, dei o seguinte exemplo: "sinto como se o mundo como está hoje fosse esse copo de cerveja abandonado na mesa; existe uma imensidão para fora dele, mas estamos todos presos dentro desse líquido já fétido e quente". Ao que ele me respondeu: "Isso porque tudo que você consegue ver é esse copo de cerveja. Mas pelo menos já desconfia da existência dessa imensidão".
Assim, voltamos ao ponto no qual você, e todos que se inspiram nas filosofias orientais, insiste: não pode haver ação transformadora no mundo se não nos transformarmos junto.
Às vezes, em momentos de extremo delírio, chego a pensar que talvez o mundo tenha sempre sido o mesmo, que ele é belo, ou melhor dizer sublime, exatamente como é; que devem existir inúmeras almas felizes que já habitam esse mundo e que a passagem para ele é somente aprender a olhar.
Isso remete ao comentário que fiz no texto sobre antropologia da imaginação: amar o mundo é viver em perigo, mas viver.
Mas deixando o delírio de lado. Mesmo presos dentro do copo de cerveja é preciso buscar uma saída, e apenas criticar a face sisuda de Janus só nos faz mergulhar mais ainda nesse líquido viscoso. É preciso lembrar que se trata de cerveja, podemos bebê-la até que não nos prenda mais, até que todas as faces sejam Baco: gaiatas, rosadas e felizes.
Falei de fim de delírio mas continuei nele... talvez a hora...
Voltando, então, ao centro desta postagem, a internet. Como o que disse do mundo, tudo é uma questão de postura. Minha crítica, no entanto, não é do veículo em si, mas das expectativas exageradas que colocam sobre ele. Como um deus ex machina a internet surge agora como o bote salva-vidas da modernidade e da alienação. Só acho que é preciso lembrar, como já coloquei em outra postagem, que se trata de mais um veículo, tão bom e tão sujeito a alienação e apropriação pela face fascista do sistema quanto qualquer outro.
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Comentário de JHolland, em 15/01/2008, às 09:56 hs
Muito belo o seu texto. Sempre admiro como vc coloca suas idéias, de uma forma simples, poética. Isso é muito importante. Revela intuição, que é essencial para o "despertar" disso que estamos falando.
É nesse sentido mesmo que considero o "cotidiano" a maior de todas as escolas - percebo que um dia começa a ser completamente diferente do outro, o mesmo acontecendo até mesmo com a noite ! Lembro de uma frase do Raoul Vaneigem: "Existem mais verdades em 24 horas da vida de um ser humano do que em todas as filosofias." Ao percebermos isso é como se mudássemos para um outro planeta ! No Budismo, diz-se que podemos ter a abordagem "mal humorada" e a "bem humorada" da Sansara.