Fonte: http://www.adorocinemabrasileiro.com.br/personalidades/alberto-cavalcanti/alberto-cavalcanti.asp
Alberto Cavalcanti nasceu numa família de militares positivistas do Nordeste, então instalados na capital da República.
- Neste meio tradicional, a personalidade extrovertida de Cavalcanti, vo1tada desde cedo para as artes, chega às raias da incompatibilidade devido à sua homossexualidade.
- Arquiteto formado em Genebra, estuda belas-artes em Paris e não se adapta mais à vida no Rio de Janeiro. - Sua primeira experiência no cinema ocorre em Paris, a partir de 1922, como assistente e cenógrafo de Marcel L'Herbier.
- Cavalcanti se integra perfeitamente ao ambiente intelectual, dominado então pelo surrealismo.
- O jovem brasileiro participa da efervescência conhecida como a primeira vanguarda francesa, uma corrente impressionista empenhada em afirmar a especificidade do cinema em relação ao teatro e ao folhetim.
- Rien Que Les Heures (1926) demonstra o talento de Cavalcanti e sua sensibilidade, ao transformar a cidade na verdadeira personagem de um filme em parte documental, em parte ficcional. Filmado pouco depois de Le Train Sansyeux, sua estréia como diretor numa linha mais convencional, Rien Que Les Heures anuncia as sinfonias urbanas de Walter Ruttmann e Dziga Vertov, Adalberto Kemeny e Rodolfo Rex Lustig. Um drama portuário pessimista.
- En Rade, inicia sua colaboração com a atriz Catherine Hessling e certa rivalidade com Jean Renoir, intérprete do proxeneta no curta-metragem La P'tite Lili (1927).
- No contexto artesanal e instável do cinema francês, Cavalcanti alterna experiências poéticas como En Rade ou Le Petit Chaperon Rouge, com adaptações mais prosaicas como Yvette (baseada em Maupassant) ou Le capitaine fracasse (baseada em Théophile Gautier).
- O aparecimento do cinema sonoro encerra essa primeira fase de afirmação criativa e profissional.
- A segunda fase da sua carreira, também na França, assinala a integração numa verdadeira indústria, a produção em série organizada pela Paramount nos estúdios de Joinville.
- Nos primeiros anos do cinema falado, as companhias norte-americanas procuram consolidar seus mercados com uma produção barata filmada em várias línguas: profissionais de diversas origens conhecem por dentro o sistema dos estúdios, o modelo hegemônico de Hollywood.
- Cavalcanti dirige em Joinville versões francesas e um filme em português (A Canção Do Berço), antes de assumir outros projetos comerciais de produtores locais.
- A terceira e a quarta fase da carreira de Cavalcanti transcorrem na Grã-Bretanha, repetindo a anterior alternância entre o experimentalismo e o sistema dos estúdios.
- Procurando aproveitar as novas possibilidades expressivas abertas pelo som, Cavalcanti aceita o convite de John Grierson e entra para a equipe do General Post Office Film Unit. Apesar do seu caráter institucional, a produção do GPO revoluciona o documentário de cunho social.
- Na escola documentária britânica, a dupla com maior vivência formada por Grierson e Cavalcanti possui uma boa dose de rivalidade, polarizada pelas prioridades políticas do escocês e a exigência formal do brasileiro.
- Pela primeira vez, Cavalcantt pode dar vazão à sua vocação pedagógica, estimulando a formação de um grupo de jovens cineastas capazes de conciliar a serisibilidade social e a renovação da linguagem (Hany Watt, Humphrey Jennings. Len Lye).
- A fusão criativa da imagem e do som, o comentário e a música, a pesquisa em torno do ritmo (esboçada desde Rien Que Les Heures), encontram um novo campo de expressão.
- Além da sua contribuição muitas vezes anônima à maioria dos filmes do GPO, o cineasta brasileiro realiza em 1934, Pett And Pott e em 1936 o clássico Coalface.
- Ao mesmo tempo, empreende uma reflexão sobre o documentário (e o realismo cinematográfico) em forma de antologia de longa-metragem, Film and Reality.
- Durante a Segunda Guerra Mundial, recusa a nacionalidade britânica. Passa a trabalhar para os estúdios Ealing, de Michael Balcon, um dos pilares da indústria inglesa.
- Nessa quarta fase da carreira, suas condições de atuação mudam completamente, mas Cavalcanti mantém o papel de formador de uma nova geração de diretores: Charles Frend, Charles Crichton, Basil Dearden e Robert Hamer. Com os três últimos compartilha a direção de um dos seus maiores sucessos, o episódio 'The Ventriloquist's Dummy' de Dead of Night.
Dead of Night ("Na Solidão da Noite")
- Cavalcanti começa na Ealing fazendo um filme de montagem de propaganda contra Mussolini (Yellow Caesar, 1941) e atuando como produtor associado de The Foreman Went to France (Querer é poder, Charles Frend, 1942).
- Depois dirige o longa-metragem Quarenta E Oito Horas, o único filmado na Grã-Bretanha durante a guerra a considerar a hipótese de uma invasão. Trata-se de um filme "incômodo", sem personagem principal nem sentimentalismo, afastado dos parâmetros do cinema bélico, cuja incongruência é valorizada "a posteriori" e atribuída à influência surrealista.
- Cavalcanti dirige com a mesma competência duas fitas ambientadas no século XIX: ChampagneCharlie e The Life and Adventures of Nicholas Nickleby, baseada em romance de Charles Dickens.
- Depois de afastar-se da companhia de Michael Balcon, dirige mais três filmes na Inglaterra: Nas Garras Da Fatalidade, O Príncipe Regente e O Transgressor.
- Uma nova frustração, o projeto abortado de adaptar Sparkenbroke, de Charles Morgan para a Rank, provoca outra mudança de rumo, a quinta fase da sua carreira: aceita a proposta de Assis Chateaubriand para dar uma série de palestras sobre cinema no Museu de Arte de São Paulo em 1949.
- Cavalcanti volta ao Brasil pela primeira vez em 30 anos e descobre um ambiente cultural desconhecido.
- Assume a orientação artística da nova Companhia Cinematográfica Vera Cruz*, como produtor geral (1950), um autêntico desafio. Contrata e leva para os estúdios de São Bernardo do Campo técnicos de diversas origens. Supervisiona a primeira produção da Vera Cruz, Caiçara, de Adolfo Celi, e os documentários Painel e Santuário (ambos de Lima Barreto), tropeça em Terra É Sempre Terra, de Tom Payne e fracassa ao tentar encaminhar Ângela (primeiro longa-metragem cuja direção tinha sido confiada a um brasileiro, Martim Gonçalves).
- Os desentendimentos e a ruptura com os donos da companhia são muito rápidos e provocam uma campanha de desprestígio proporcional às expectativas criadas em torno do único cineasta brasileiro com trajetória internacional. De fato, ninguém no Brasil possuía experiência tão rica, na direção e produção, na vanguarda experimental e no sistema dos estúdios, na formação de equipes e novos cineastas. Até então, o cinema nacional acumulava fracassos e veleidades. No entanto, sobre Cavalcanti confluem os preconceitos de conservadores e comunistas, grã-finos e intelectuais, que rejeitam sua personalidade e autoridade.
- Dirige Simão, O Caolho, ainda em São Paulo, para a Maristela, além de dois filmes para a nova produtora carioca Kino Filmes, O Canto Do Mar e Mulher De Verdade.
- Durante essa fase, Cavalcanti elabora o primeiro projeto do Instituto Nacional do Cinema (INC) e publica o livro "Filme e realidade", uma reflexão pioneira sobre o panorama do cinema brasileiro.
- Desgostoso, empreende a volta à Europa.- A sexta e última fase da vida de Cavalcanti, a mais prolongada e melancólica, é a de um homem sucessivamente deslocado de três países (a França, a Grã-Bretanha e o Brasil), e que oscila entre o seu refúgio de Anacapri (Itália) e uma atividade nômade por força das circunstâncias.
- Uma das novidades é sua condição de companheiro de viagem do comunismo, iniciada com a filmagem de O senhor Puntila e seu criado Matti, Áustria, e o encontro com o próprio autor, Bertolt Brecht.
- Com Joris Ivens, supervisiona o filme de episódios A Rosa-Dos-Ventos (1955), produção internacional patrocinada pela antiga Alemanha Oriental, cuja parte brasileira foi escrita por Jorge Amado, Cavalcanti e Trigueirinho Neto, dirigida por Alex Viany e interpretada por Vanja Orico e Miguel Torres.
- Além de trabalhos para televisão e teatro, Cavalcanti empreende um balanço da sua obra, sob a forma de antologia temática, Um Homem E O Cinema, co-produzida pela Embrafilme.
- Inconformado com a frustração da sua quinta fase (a Vera Cruz nunca chegou a filmar a biografia de Noel Rosa que ele planejara), mantém durante os últimos anos um projeto brasileiro que não consegue levar adiante, "O Dr. Judeu", baseado na vida de Antonio José da Silva, vítima da Inquisição (filmada finalmente por Jom Tob Azulay, produtor de Um Homem E O Cinema).
- Antônio Carlos Fontoura dirige o média-metragem Brasília (1982), a partir de um roteiro de Cavalcanti.
- Simão, O Caolho, interpretado por Mesquitinha, é uma comédia ambientada nos bairros populares de São Paulo. Sua inspiração está mais próxima do neo-realismo do que da chanchada carioca, misturando toques sociais, políticos e religiosos com uma fantasia ingênua.
- Mulher De Verdade, menos pretensiosa ainda, é uma comédia de situações que se presta a certas ironias sobre as relações entre homens e mulheres.
- Ambos os filmes contribuem à diversificação da comédia, único gênero que se constitui com continuidade no cinema brasileiro. - Mais importantes, O Canto Do Mar e o episódio brasileiro de A Rosa-Dos-Ventos, 'Ana', representam uma guinada na temática nordestina do cinema nacional contemporâneo, depois do desaparecimento dos Ciclos Regionais do período mudo. Enquanto O Cangaceiro procura aclimatar as convenções do gênero épico e o lirismo musical do cinema mexicano à produção industrial paulista, Cavalcanti prefere explorar os caminhos inéditos no Brasil de um realismo humanista. O Canto Do Mar e A Rosa-Dos-Ventos foram filmados no Nordeste, região que voltaria a atrair Trigueirinho Neto e Miguel Torres, ligados à renovação dos anos 60.
- Reduzir O Canto Do Mar a um simples remake de En Rade ou criticar seus aspectos folclóricos é parte da miopia da época. O hibridismo entre a antiga vanguarda e a crescente sensibilidade social mostram que tanto o filme quanto o cineasta são figuras da transição entre o velho e o novo. O próprio tom desesperado, afastado dos padrões então vigentes no "realismo socialista" parece sintonizado com o sentimento moderno perceptível nos filmes do Cinema Novo, menos impregnados de messianismo militante. O Canto Do Mar seria suficiente para garantir a Cavalcanti um lugar de destaque na história do cinema brasileiro, sem falar na sua participação em vários momentos decisivos da história do cinema mundial (a vanguarda francesa, o documentário social, a Ealing).
- Ele morre em Paris, no dia 23 de agosto de 1982.
- No Festival internacional de São Paulo de 2002 teve uma retospectiva em sua homenagem.
- No ano de 2005 o Ministério da Cultura e o SESC-Rio se uniram para homenageá-lo, as homenagens, que se estendem na ponte Brasil-França neste ano, começaram com o lançamento do livro "Alberto Cavalcanti - o cineasta do mundo", de Sergio Caldieri, no dia 21 de fevereiro de 2005, no Art SESC Flamengo, no Rio de Janeiro. A celebração prossegue, em março, com a abertura de uma exposição multimídia no Espaço SESC, em Copacabana, e de uma mostra de 18 filmes na Cinemateca do MAM. Nesta ocasião também será lançado um catálogo completo de sua obra, com filmografia detalhada de cerca de 126 filmes e bibliografia de referência.
Diretor
1977 - Um Homem E O Cinema
1967 - Story of Israel
1962 - Yerma
1961 - The Monster of Highgate Ponds
1958 - A Primeira Noite
1955 - O Senhor Puntila E Seu Criado Matti1954 - Mulher De Verdade
1953 - O Canto Do Mar
1948 - O Transgressor
1947 - Nas Garras Da Fatalidade
1947 - O Príncipe Regente
1946 - The Life And Adventures Of Nicholas Nickleby
1945 - Deadofnight (2º Episódio: 'The Christmas Story' E 4º Episódio: 'The Ventriloquists Dummy')
1944 - Champagne Charlie
1942 - Film And Reality
1942 - Quarenta E Oito Horas
1933 - Le Mari Garçon
1933 - Coralie Et Cie
1932 - O Tio Da América
1931 - Dans Une Ïle Perdue
1930 - Toute Sa Vie
1930 - A Canção Do Berço
1930 - A Michemin Du Ciel
1930 - Les Vacances Du Diable
1927- Yvette
1927 - En Rade
1926 - Rien Que Les Heures
1926 - Le Train Sans Yeux
1928 - Le Capitaine Fracasse
Premiações
- Melhor diretor, prêmio "Associação Brasileira de Cronistas Cinematográficos", Rio de Janeiro, em 1952
- Melhor diretor no prêmio "Sací", São Paulo, em 1952.
(fonte básica: "Enciclopédia do Cinema Brasileiro")