Ronaldo Lemos
Laurel Ptak criou uma obra polêmica. A artista escreveu um
manifesto chamado "Salários pelo Facebook" exibida no museu da
Universidade da Califórnia em San Diego. De acordo com ela, todo usuário
do site deveria receber um "salário" por conta do trabalho gratuito
feito para ele (veja o texto em wagesforfacebook.com )
Apesar do exagero da obra, não dá para negar que o trabalho neste
século está mudando completamente. Muita gente hoje trabalha das 8h às
18h para seus empregadores e quando chega em casa trabalha das 18h até
tarde para várias empresas da internet.
Mesmo depois da jornada "oficial", continuamos a produzir valor
para alguém quando usamos serviços on-line. Essa produção acontece até
nos tempos mortos da vida. Está esperando o elevador? Dá tempo de fazer
um ou dois posts e gerar centavos em algum lugar.
Na França, o tema ganhou contornos institucionais. Um relatório do
governo francês chega a debater se o imposto sobre folha de pagamento
deveria ser estendido a esse "trabalho" feito nas redes sociais. A
premissa é de que seríamos todos funcionários (ou "microfuncionários")
de várias empresas de tecnologia. Por conta disso, o valor gerado nessas
atividades seria passível de tributação, tal como acontece na folha de
pagamento "tradicional".
É claro que essa discussão é complexa. E que o tema precisa ser
visto com lentes mais sofisticadas do que aquelas usadas no passado. Mas
é fato que as fronteiras entre trabalho, lazer e consumo estão deixando
de existir.
Um relatório do Instituto de Museus e Bibliotecas dos EUA chama
atenção justamente para o fenômeno da multiplicação dos empregos. Se no
século passado esperava-se que as pessoas tivessem no máximo 2 empregos
ao longo da vida, hoje a expectativa é que sejam entre 10 e 15.
Nesse contexto, deveria ser aceitável atualizar o currículo
profissional para incluir outras habilidades "profissionais". Por
exemplo, além de colunista da Folha, poderia adicionar: curador de
conteúdo para o Facebook, organizador de informações para o Google,
jornalista cidadão para o Twitter e o WhatsApp, corretor de imóveis para
o Airbnb, colunista social para o Instagram, agente de talentos para o
Kickstarter, DJ para o Spotify e gestor de banco de currículos para o
Linkedin.
Há quem proponha que o caminho é construir um novo pacto social
sobre a criação e uso da informação, reafirmando a separação entre
trabalho e vida. Tarefa que hoje parece utópica. Alguém conceberia um
acordo social pelo qual ninguém mais precisaria ler ou responder
mensagens nos fins de semana? Ou fora do horário de trabalho? Ao menos,
são provocações que sinalizam um desejo de que nossa relação com a
informação torne-se também sustentável.
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JÁ ERA
Achar que games são mero entretenimento
JÁ É
Games sendo reconhecidos como plataforma para temas "sérios"
JÁ VEM
"Thralled", game-ensaio sobre o período da escravidão no Brasil