quinta-feira, 15 de janeiro de 2009

O oceano Ártico está bombeando mais calor na atmosfera


Entrevista especial com Mark Serreze


A calota polar do Ártico nunca foi tão pequena quanto atualmente. Um estudo da WWF apontou que em 2008 o nível de cobertura de gelo do Pólo Norte está inferior aos 4,13 milhões de quilômetros quadrados do ano anterior. A espessura do gelo na região é tão fina que já se prevê que, em alguns dias do verão, o Ártico pode ficar praticamente sem gelo. “Em comparação com o resto do Planeta, o Ártico é a via rápida para as consequências das alterações climáticas”, disse-nos o professor de Geografia da Universidade do Colorado, nos Estados Unidos, Mark Serreze. Em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line, Serreze explicou qual a situação do Ártico e da Antártida hoje, além de falar sobre como o aquecimento global está atingindo o pólo norte e que consequências isso gera para o Planeta. “A cobertura do gero marinho funciona como uma barreira, um isolante, entre a atmosfera quente e o frio bastante intenso abaixo do oceano de gelo. Quando perdemos essa cobertura de gelo sobre o mar, perdemos o isolador. Com isso, o oceano começa o bombeamento de calor na atmosfera, contribuindo para o aquecimento do Planeta”, relatou ele.

Mark Serreze é pós-graduado em geografia e professor e pesquisador da Universidade do Colorado, nos Estado Unidos. É também cientista sênior do Centro Nacional de Monitoramento de Neve e Gelo (NSIDC). Recentemente, desenvolveu uma pesquisa, juntamente com a professora Julienne Stroeve, em que revelou provas importantes de que as temperaturas da região do Ártico estão se elevando numa velocidade maior do que as do restante do mundo.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Em que situação está, atualmente, o degelo do Ártico?

Mark Serreze
- Em comparação com o resto do Planeta, o Ártico é a via rápida para as consequências das alterações climáticas. Em setembro de 2008, o nível do mar de gelo foi o segundo mais baixo registrado pelos satélites, apenas um pouco mais elevado do que o registrado um ano antes. O mar de gelo da Groenlândia está começando a derreter por baixo, contribuindo para o aumento do nível do mar. O Permafrost [1] (o solo congelado que subjaz as terras do Ártico) está aquecendo e descongelando. Áreas que antigamente eram desarborizadas estão, hoje, tomadas por arbustos. Essa é a situação geral do Ártico, atualmente.

IHU On-Line – O gelo Ártico pode desaparecer?

Mark Serreze
– A capa de gelo do mar Ártico é suscetível ao desaparecimento durante o final do verão e o princípio do outono (nos meses de agosto e setembro) em, provavelmente, 30 anos ou mais. No entanto, ainda haverá gelo no inverno durante séculos, mesmo com o aquecimento global, e este continuará sendo frio e escuro. Porém, o gelo que se forma no inverno vai derreter durante o verão.

IHU On-Line – Por que a temperatura no Ártico sobe mais rapidamente do que o resto do mundo?

Mark Serreze –
Há uma série de razões que explicam o motivo pelo qual a temperatura do Ártico irá aumentar mais do que em outras regiões do Planeta, mas o mais importante é o efeito de perda da capa de gelo marítimo flutuante. A cobertura do gero marinho funciona como uma barreira, um isolante, entre a atmosfera quente e o frio bastante intenso abaixo do oceano de gelo. Quando perdemos essa cobertura de gelo sobre o mar, perdemos o isolador. Com isso, o oceano começa o bombeamento de calor na atmosfera, contribuindo para o aquecimento do Planeta. Isso é conhecido como amplificação do Ártico. Observações que fizemos mostram que a amplificação do Ártico já começou.




IHU On-Line – Num plano mais amplo, qual é a situação dos oceanos?

Mark Serreze –
Como disse antes, o oceano Ártico está bombeando mais calor na atmosfera e, com isso, todos os oceanos estão aquecendo também. O gelo do mar está sendo “machucado” de duas formas: com o clima quente e com a temperatura mais quente do Oceano Ártico. Ambos significam que o verão tende a derreter mais gelo e o crescimento de gelo no inverno será menor.

IHU On-Line – O Pólo Sul está na mesma situação do Pólo Norte? Qual é o estado atual de gelo no sul dos oceanos?

Mark Serreze –
O mar de gelo antártico é o que aumentou ligeiramente, em grande parte em resposta às mudanças na circulação da atmosfera. Não há surpresa alguma nisso. Todos os nossos modelos climáticos mostram que é no Ártico onde os sinais de aquecimento global se apresentarão de modo mais acentuado e que a Antártica vai mudar de forma muito mais lenta. Ao sul, o gelo marinho pode mesmo aumentar por algum tempo. Os céticos com relação às mudanças climáticas gostam de argumentar que, já que a Antártica não está realmente mudando como o Ártico, os cientistas que estudam o clima devem estar errados. Mas são eles quem estão errados, uma vez que, em relação às mudanças climáticas, a Antártida sempre comportou-se muito bem.






IHU On-Line – Em sua opinião, com que perspectiva o homem deve olhar e tratar o ecossistema?

Mark Serreze –
Quanto mais tempo esperarmos para enfrentar as alterações climáticas, o problema será pior. Esta questão não diz respeito simplesmente ao aquecimento, mas como este aquecimento mudará o Planeta (como, por exemplo, nos padrões de precipitação), afetando tanto a parte terrestre quanto os oceanos e os ecossistemas.

IHU On-Line – O sistema político mundial está dando que tipo de resposta para o problema dos oceanos e, sobretudo, o problema do aquecimento global?

Mark Serreze –
Para que finalmente os nossos líderes eleitos nos Estados Unidos aceitem que o aquecimento global é real e que precisamos fazer algo sobre isso. O aquecimento global é um problema mundial e exige uma solução global. No entanto, os Estados Unidos têm de assumir a liderança em relação às soluções para o aquecimento global. Tenho esperança de que agora finalmente fará isso.

Notas:

[1] Permafrost é um termo inglês para nomear o tipo de solo encontrado na região do Ártico. É constituído por terra, gelo e rochas permanentemente congelados. Esta camada é recoberta por uma camada de gelo e neve que, se no inverno chega a atingir 300 metros de profundidade em alguns locais, ao se derreter no verão, reduz-se para de 0,5 a 2 metros, tornando a superfície do solo pantanosa, uma vez que as águas não são absorvidas pelo solo congelado.