Eis o artigo.
Vigília pela Amazônia
Na quarta-feira à noite haverá no Senado uma vigília em favor da preservação da Amazônia. A ideia começou a tomar corpo com a reação inconformada da atriz Cristiane Torloni diante da dificuldade de dar consequência ao abaixo-assinado "Amazônia para Sempre", com mais de um milhão de assinaturas, encabeçado por ela, Vitor Fasano e Juca de Oliveira. Em conversa com os senadores Cristovam Buarque e Ideli Salvatti, surgiu a ideia da vigília, encampada por um grupo de senadores e apoiada pelo presidente José Sarney.
Esse ato será importante também por lembrar ao Brasil o Congresso parceiro da população, no momento em que, com justa indignação, muitos chegam a considerá-lo irrelevante. E por lembrar ao Congresso o seu papel central, de batalhar pelas demandas da maioria da sociedade.
O momento é crucial. Movimentos agressivos no governo, no próprio Congresso e em setores empresariais empenham-se em jogar no lixo décadas de construção de um arcabouço jurídico ambiental moderno, compatível com o conhecimento alcançado sobre a relação indissolúvel entre equilíbrio ambiental e desenvolvimento justo e duradouro.
Há um risco na vigília: o de virar paisagem. Um evento no qual muitos declarem seu extremado amor à Amazônia, mas literalmente da boca para fora. Não dá mais para fazer de conta e, na prática, agir para promover interesses que insistem em ignorar a necessidade de cumprir a legislação ambiental.
Esse jogo está esgotado, como bem demonstram os últimos e enfáticos sinais que vêm da população. Além do número de assinaturas no manifesto dos artistas, o site GloboAmazônia contabiliza, em apenas oito meses, mais de 45 milhões de protestos contra queimadas e desmatamento. Isso dá a média de mais de 5 milhões de protestos por mês ou cerca de 180 mil protestos por dia, ou quase 8.000 protestos a cada hora. E ainda há a recente pesquisa Datafolha/Amigos da Terra, segundo a qual 94% querem parar o desmatamento contra apenas 3% que permitiriam mais desmatamento para aumentar a produção agrícola.
Ou seja, a população sabe o que quer. O que falta para seus representantes entenderem e atenderem seu clamor? É preciso cuidar para que a vigília não sirva à celebração de consenso retórico, vazio.
Que ela tenha a força de colocar à mesa compromissos reais, sem dubiedades, sem discursos de uma única noite. Como por exemplo, aprovar os projetos de lei que promovem a proteção e o desenvolvimento sustentável da Amazônia e que se encontram engavetados, como é o caso do que cria o FPE Verde e tantos outros.
Ruralistas iniciam sua maior ofensiva contra leis ambientais
Seja por intermédio de suas bancadas na Câmara e no Senado ou através de suas entidades de classe, os setores ligados ao agronegócio e às obras de infra-estrutura estão mobilizados de Norte a Sul para reverter pontos da legislação ambiental por eles considerados como um entrave ao desenvolvimento produtivo do país.
A reportagem é de Maurício Thuswohl e publicada pela Carta Maior, 13-05-2009.
Ao que tudo indica, os últimos 18 meses do governo Lula serão marcados por uma forte ofensiva ruralista contra os avanços conquistados pelo Brasil em sua política ambiental. Seja por intermédio de suas bancadas na Câmara e no Senado ou através de suas entidades de classe, os setores ligados ao agronegócio e às obras de infra-estrutura estão mobilizados de Norte a Sul para reverter pontos da legislação ambiental por eles considerados como um entrave ao desenvolvimento produtivo do país. Essa contra-ofensiva passa pela aprovação no Congresso de duas Medidas Provisórias que alteram o atual Código Florestal e também pela tentativa de retirar da União e transferir aos estados a prerrogativa de definir as políticas ambientais.
Já aprovada na Câmara, encontra-se agora em discussão no Senado a MP 452 que, apesar de originalmente tratar da regulamentação do Fundo Soberano, leva de “carona” uma emenda feita pelo relator, deputado José Guimarães (PT-CE), que acaba com a obrigatoriedade de concessão de licença ambiental para as obras a serem realizadas em rodovias federais já existentes. Além disso, a MP 452 também estabelece o prazo máximo de 60 dias para que o Ibama conceda as licenças de instalação para obras em rodovias, o que, na prática, fará com que estas obras possam ser iniciadas sem a obtenção das licenças.
Existem atualmente em processo de análise no Ibama 183 pedidos de licenciamento em rodovias, dos quais apenas 82 já receberam licença prévia do órgão ambiental. As obras do PAC são responsáveis por 140 destes pedidos, fato que faz com que os parlamentares ligados ao agronegócio estejam otimistas em receber o decisivo apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff. Até o momento, nem o presidente nem a ministra externaram suas posições.
Outra Medida Provisória que aguarda votação na Câmara, onde deverá ser aprovada, é a MP 458, que trata da regularização fundiária de terras pertencentes à União localizadas nos nove Estados da Amazônia Legal. Quando foi enviada ao Congresso pela Presidência da República, a MP 458 contava com o apoio do movimento socioambientalista, pois tinha forte cunho social ao determinar a regularização de propriedades de até 1,5 mil hectares. No entanto, as modificações introduzidas pelo relator, deputado Asdrúbal Bentes (PMDB-PA), desfiguraram a MP.
Entre as alterações sugeridas por Bentes - e rejeitadas pelos ambientalistas - estão a inclusão de áreas devolutas localizadas em faixa de fronteira, além de outras áreas sob domínio da União, no processo de regularização fundiária, e também a retirada da exigência de que o ocupante não seja proprietário de imóvel rural em qualquer parte do território nacional. Além disso, o texto que deverá ser aprovado pelos deputados exclui o parágrafo que impedia a regularização de área rural ocupada por pessoa jurídica: “Essas novas regras legalizarão a grilagem, aumentarão a concentração fundiária e a violência no campo e incentivarão o desmatamento”, resume Raul do Valle, que é coordenador do Programa de Política e Direito Socioambiental do Instituto Socioambiental (ISA).
Senado decide
Assim como no caso da MP 452, caberá ao Senado dar a exata medida das chances políticas que tem a MP 458, na forma como está, de se tornar realidade. A disputa em torno das duas Medidas Provisórias será protagonizada por duas parlamentares de peso. De um lado, Kátia Abreu (DEM-TO), que é presidente da Confederação Nacional de Agricultura (CNA) e tem se destacado como a maior liderança política dos ruralistas nesses seis anos e meio de governo Lula. Do outro, a ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva (PT-AC), que tem enorme prestígio internacional e é a principal porta-voz política do movimento socioambientalista brasileiro.
Em discurso realizado na tribuna do Senado na semana passada, Marina afirmou que “segmentos do agronegócio e da infraestrutura se revezam em um jogral de satanização das conquistas ambientais que a sociedade brasileira conseguiu inscrever no arcabouço legal de nosso país”. Segundo a ex-ministra, estes setores “agora estão imbuídos em convencer a sociedade brasileira de que a legislação que protege o que restou da floresta, que protege a nossa biodiversidade e as margens dos rios é a maior inimiga para o crescimento e expansão da agricultura no país”.
Novo Código
Kátia Abreu, por sua vez, alia o comando da pressão ruralista no Senado à articulação nacional das principais entidades representativas dos grandes produtores. Também na semana passada, a senadora levou ao Congresso uma proposta elaborada em conjunto pela CNA e pela Sociedade Rural Brasileira (SBR) que sugere uma ampla reformulação no Código Florestal.
Entre as mudanças propostas pelos ruralistas estão o fim da obrigatoriedade de recompor as Áreas de Proteção Permanente (APPs) no mesmo bioma onde houve desmatamento, a permissão para compor 50% da reserva legal com espécies exóticas ao bioma e a manutenção das áreas “consolidadas pela agricultura” mesmo em biomas considerados ameaçados.
O ponto fundamental de um novo “Código Ambiental Brasileiro”, de acordo com o desejo dos ruralistas, seria a transferência para os Estados da atribuição de definir as políticas ambientais, o que hoje é prerrogativa exclusiva da União: “Se o governo federal descentralizou a saúde e a educação, por que não o meio ambiente também? Cada Estado tem suas peculiaridades ambientais e agrícolas e pode deliberar sobre elas”, diz Kátia Abreu.
Governadores ruralistas
A pressão no Congresso - onde 33 propostas de alteração do Código Florestal já foram protocoladas por parlamentares ruralistas - acontece paralelamente à ação dos governadores mais ligados à cartilha do agronegócio. O governador de Santa Catarina, Luiz Henrique Silveira (PMDB), deu a largada ao usar sua maioria na Assembléia Legislativa para aprovar um código florestal estadual que, entre outras afrontas à legislação federal, reduziu para cinco metros a faixa de proteção das matas ciliares (localizadas às margens dos rios e lagos).
As alterações na legislação ambiental apoiadas por Luiz Henrique em seu estado são objeto de três Ações Diretas de Inconstitucionalidade (Adins) movidas, respectivamente, pelo PV, pelo Ministério Público Federal e pelo Ministério Público de Santa Catarina. Ainda assim, outros governadores, como Aécio Neves (PSDB) de Minas Gerais, falam em seguir o exemplo catarinense e já mobilizam suas bases de deputados para criar um código ambiental estadual.
A governadora do Rio Grande do Sul, Yeda Crusius (PSDB), foi a mais recente adesão ao movimento de pressão pela criação de legislações ambientais estaduais que contradigam as leis federais. Mesmo acossada por uma ameaça de impeachment, Yeda encontrou tempo para exortar seus deputados a criarem um código ambiental estadual: “Cada estado deve ter uma legislação própria para decidir os rumos de suas riquezas ambientais. O Código Florestal Brasileiro tem mais de 40 anos e precisa ser modernizado e adequado às realidades regionais”, disse.
Ruralistas vencem na MP da regularização de terras da Amazônia
Um acordo entre líderes do governo e da oposição para relaxar as condicionantes ambientais permitiu a aprovação, ontem, no plenário da Câmara dos Deputados, da medida provisória de regularização fundiária de posses com até 1,5 mil hectares na Amazônia. A MP 458 deve regularizar a situação jurídica de 400 mil posses em 436 municípios da Amazônia. Em jogo, estão os interesses de 1,2 milhão posseiros na região.
A reportagem é de Mauro Zanatta e Mônica Izaguirre e publicada pelo jornal Valor, 14-05-2009.
Influenciados pelas teses da bancada ruralista, os parlamentares mudaram o relatório original do deputado Asdrúbal Bentes (PMDB-PA) para isentar os posseiros da obrigação de recuperar as áreas de preservação permanente (APPs) e reserva legal. Os deputados transformaram a situação em um "compromisso". O relator também permitiu a compensação da reserva legal obrigatória de 80% da propriedade na Amazônia.
Bentes recuou, ainda, na intenção de punir com a reversão da posse à União para quem descumprisse a legislação ambiental na Amazônia. Pelo novo texto, a punição ocorrerá somente em casos de desmatamento irregular em APPs e reservas legais. Além disso, concordou que o governo indenize posseiros em caso de retomada das terras pela União por descumprimento de alguma imposição legal. E incluíram a indenização de benfeitorias aos posseiros.
Antes das discussões, o relatório já havia ampliado, de dez para 30 anos, o prazo para recomposição de APPs e reserva legal, além de ter permitido a regularização de áreas em nome servidores públicos e de pessoas jurídicas.
Desde o fim de fevereiro, o texto da MP foi alterado algumas vezes. Asdrúbal Bentes ampliou a regularização para todas as áreas da União, e não só para aquelas do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra). O texto básico permitiu, ainda, a venda das terras regularizadas após três anos de posse efetiva desde que fosse concedida anuência de representantes da União. Antes, o prazo era de dez anos. A MP n 458 também estabeleceu um prazo de até três anos aos Estados da Amazônia para a realização de zoneamentos econômicos e ecológicos (ZEEs). Do contrário, esses Estados não poderiam firmar convênios com a União. Pelo texto, serão doadas posses de até 100 hectares. Para terras até 400 hectares haverá um processo simplificado com "valor simbólico" . Quem tiver até 1,5 mil hectares, terá preferência para comprar a terra pelo "valor de mercado". Acima disso, haverá licitação pública normal.
Até as 22h nem todos os destaques (supressivos ou para incluir emendas não acatadas pelo relator) tinham sido votados. Mas todos os que tinham sido apreciado foram rejeitados, prevalecendo nesses casos, portanto, o texto inicialmente aprovado pelo plenário. O DEM, PPS e PSDB tentaram, sem sucesso, retirar a restrição de venda de terras a quem já tem propriedade rural no país (destaque do DEM). Também foi minoritário o voto desses partidos para retirar a data limite de ocupação ou invasão (destaque do PSDB) que continuou sendo 1 de dezembro de 2004. Foi rejeitado também destaque do PPS para que o preço da terra fosse limitado aos 20% passsíveis de desmatamento. Já o PDT viu rejeitada a proposta de excluir as pessoas jurídicas. O líder do governo, Henrique Fontana (PT-RS)) argumentou que isso seria incompatível com a realidade atual da situação da Amazônia, limitando muito o processo de legalização.
Fontes:
http://www.unisinos.br/_ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=22161
http://www.unisinos.br/_ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=22251
http://www.unisinos.br/_ihu/index.php?option=com_noticias&Itemid=18&task=detalhe&id=22240
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