terça-feira, 24 de junho de 2008

O novo e viciado plano de energia de Bush


24/06/2008


De Thomas L. Friedman
Colunista do The New York Times

Há dois anos, o presidente Bush declarou que os Estados Unidos estavam "viciados em petróleo" e que faria algo a respeito. Bem, agora ele fez. Agora nós temos o novo plano de energia de Bush: "Fiquem mais viciados em petróleo".

Na verdade, é mais sofisticado que isso: faça com que a Arábia Saudita, nosso principal "traficante" de petróleo, aumente nossa dose por algum tempo e reduza o preço do petróleo apenas o suficiente para que alternativas de energia renovável não possam decolar totalmente. Então tente forçar o Congresso a suspender a proibição de explorar petróleo em alto-mar e no Refúgio Nacional da Vida Selvagem do Ártico.

É como se nosso viciado-em-chefe estivesse nos dizendo: Qualé, pessoal, vocês sabem que querem um pouco mais da coisa boa. Mais uma dose, garota. Só mais uma tragada. Eu prometo que no próximo ano, nós todos estaremos limpos. Eu até mesmo colocarei uma turbina eólica na minha biblioteca presidencial. Mas por ora, me dê esse barato mais uma vez. Apenas mais uma transfusão daquele óleo cru do alto-mar."

É difícil encontrar palavras pra expressar que desculpa patética, imensa e fraudulenta esta política energética é. Mas fica melhor. O presidente de fato teve a ousadia de estabelecer um prazo para este vício:

"Eu sei que os líderes democratas se opuseram a algumas destas políticas no passado", disse Bush. "Agora que a oposição deles ajudou a elevar os preços da gasolina a níveis recordes, eu peço para que reconsiderem suas posições. Se os líderes do Congresso saírem para o recesso de 4 de Julho sem agir, eles precisarão explicar por que uma gasolina a US$ 4 o galão não é um incentivo suficiente para agirem."

Isto vindo de um presidente que por seis anos resistiu a qualquer pressão sobre Detroit para que melhorasse seriamente os padrões de desempenho de seus beberrões de gasolina; isto vindo de um presidente que não fez nada para encorajar a economia de energia; isto vindo de um presidente que neutralizou tanto a Agência de Proteção Ambiental que o chefe desta atualmente parece estar em um programa de proteção de testemunhas. Eu aposto que não há 12 leitores deste jornal que sejam capazes de dizer qual é o seu nome ou identificá-lo em uma fila de reconhecimento policial.

Mas, acima de tudo, este prazo é dado por um presidente que não levantou um dedo para mediar a aprovação de uma legislação que está parada no Congresso há um ano, que poderia de fato ter um impacto imediato no perfil energético americano -diferente do petróleo em alto-mar que leva anos para ser extraído- além de criar bons empregos técnicos.

O projeto é o HR 6049 -"A Lei de Energia Renovável e Criação de Empregos de 2008", que estende por mais oito anos o incentivo fiscal de investimento para instalação de energia solar, estende por um ano o incentivo fiscal para produção de energia eólica e por três anos os créditos para geotérmica, energia das ondas e outras renováveis.

Estes incentivos fiscais críticos para energia renováveis vão expirar no fim deste ano fiscal e, se isso acontecer, significará milhares de empregos perdidos e bilhões de dólares em investimento não feitos. "Projetos de energia limpa nos Estados Unidos já estão sendo colocados em espera", disse Rhone Resch, presidente da Associação de Indústrias de Energia Solar.

As pessoas esquecem que a energia eólica e solar estão aqui, que elas funcionam, que podem ser instaladas no seu telhado amanhã. O que elas precisam agora é de um grande mercado americano, onde muitos fabricantes tenham o incentivo de instalar painéis solares e turbinas eólicas -porque quanto mais o fizerem, mais estas tecnologias avançarão na curva de aprendizado, se tornando mais baratas e capazes de competir diretamente com o carvão, petróleo e energia nuclear, sem subsídios.

Isto parece ser exatamente o que o Partido Republicano está tentando bloquear, já que os republicanos do Senado -lamento dizer, com a ajuda de John McCain- conseguiram derrotar a renovação destes incentivos fiscais por seis vezes diferentes.

É claro, nós vamos precisar de petróleo ainda por muitos anos. Sendo este o caso, eu preferiria -por motivos geopolíticos- ter o máximo possível de poços domésticos. Mas nosso futuro não está no petróleo, e um presidente de fato não estaria intimidando o Congresso a respeito de exploração em alto-mar. Ele estaria dizendo ao país uma verdade muito maior:

"O petróleo está envenenando nosso clima e nossa geopolítica, e aqui está como vamos nos livrar de nosso vício: nós vamos estabelecer um preço mínimo de US$ 4,50 o galão de gasolina e US$ 100 o barril de petróleo. E este preço mínimo estimulará fortes investimentos em energia renovável -particularmente eólica, painéis solares e termo-solar. E também promoveremos um programa intensivo para aumentar nossa eficiência em energia, para elevar a conservação de energia a um patamar totalmente novo e ampliar a energia nuclear. E quero que todo democrata e todo republicano se junte a mim neste empreendimento."

Isto é o que um presidente real faria. Ele nos daria um grande plano estratégico para colocar um fim ao nosso vício em petróleo e formar uma coalizão bipartidária para realizá-lo. Ele certamente não usaria seus últimos dias no cargo para ameaçar os congressistas democratas que, caso não aprovarem a exploração em alto-mar antes do recesso de 4 de Julho, eles serão culpados pela gasolina a US$ 4 o galão. Isso é ridículo. Esta é uma política energética indigna de nosso Dia da Independência.

Tradução: George El Khouri Andolfato

Fonte: http://noticias.uol.com.br/midiaglobal/nytimes/2008/06/24/ult574u8594.jhtm