segunda-feira, 24 de setembro de 2007

O COMUNITARISMO NA NOVA CONFIGURAÇÂO DAS POLÍTICAS SOCIAIS NO BRASIL

Myrtes de Aguiar Macedo (*)



(*) Professora do Departamento de Serviço Social da PUC-RIO. Doutora em Política Social, pela University of Manchester. Pesquisadora do CNPq. Coordenadora do Grupo de Pesquisa Trabalho Gênero e Políticas Sociais vinculado ao Programa de Pós-graduação em Serviço Social da PUC-Rio. Tem várias publicações referentes à temática trabalhos e políticas sociais, em particular, sobre a política de assistência social no contexto brasileiro, a partir dos anos de 1990.



A primeira parte desse texto traz reflexões sobre comunidade construídas a partir da realidade dos países capitalistas centrais em tempos de globalização. O retorno à comunidade nesses países está associado à questão do risco social crescente nas sociedades modernas, bem como, o desenraizamento do homem cosmopolita. Uma das principais contribuições nesse estudo vem sendo elaborada por Zygmunt Bauman, sociólogo polonês, e professor da Universidade de Leeds. Bauman possui vários livros traduzidos e publicados no Brasil pela Editora Zahar. Outra referência presente no debate recente sobre comunidade é representada pelo modelo de “comunidade cívica” construída por Putnam (1996) que tem por base a valorização da responsabilidade, colaboração e altruísmo enquanto virtudes capazes de construir “redes” integrativas.
As reflexões recentes desenvolvidas sobre os mudanças na relação entre Estado e sociedade no campo das políticas sociais brasileiras indicam a reelaboração do conceito de sociedade civil em decorrência da ênfase nas teorias comunitaristas que reforçam o enfoque humanitarista, intersubjetivo e integrativo das relações sociais. No Brasil, portanto, o debate atual sobre comunidade, no campo da intervenção prática, está associado ao crescimento do chamado Terceiro Setor que tem determinado o esvaziamento do conteúdo político no entendimento do conceito de sociedade civil. Para os objetivos desta comunicação, nos interessa focalizar a noção de comunidade nos processos de intervenção prática que constroem as novas formas de gestão das políticas sociais públicas.
A teoria social, que enfoca a condição de modernidade das sociedades globalizadas, reserva um lugar de destaque para a questão do risco social no debate contemporâneo. “ As sociedades de risco forjam-se a partir da precarização dos arranjos institucionais da existência humana...” (Carapinheiro, 2002). Nessa linha de pensamento, Bauman analisa a categoria de risco nas sociedades modernas pela sua ligação à desagregação de grupos sociais e de práticas sociais que antes eram unificadas, estabilizadas e consolidadas a partir da proteção social do Estado, reconhecida como Welfare State. Para Bauman, o comunitarismo “renascido” pode ser visto como um pêndulo que oscilando radicalmente, afasta-se do pólo da segurança na “díade dos valores humanos fundamentais”. Nesse contexto, Bauman aponta o desemprego, as perspectivas incertas na velhice e os infortúnios da vida urbana como as principais fontes da difusa ansiedade relativa ao presente, ao futuro próximo e ao futuro mais distante: “a falta de segurança é que une as três, e o principal apelo do comunitarismo é a promessa de um porto seguro, o destino dos sonhos dos marinheiros perdidos no mar turbulento da mudança constante, confusa e imprevisível” (Bauman, 2002). Apropriando-se da imagem do “homem modulado” para entender o homem no contexto dos grandes centros urbanos, o autor ressalta a fragilidade dos laços que ligam esses homens entre si. Neste sentido, os habitantes “modulados” não pertencem “inteiramente” a nenhum dos grupos de que participam. Isto porque nessa condição, todas as formas de comunhão são frágeis e vulneráveis, enquanto os módulos permanecem mal integrados – se constituem fonte de constante tensão. Para Semeraro, a corrente comunitarista hoje, se dirige à sociedade civil com um discurso que visa a recuperar as relações humanas e incentivar a integração social das pessoas, distanciando-se de qualquer concepção liberal, abstrata e universalista (Semeraro, 2001: 259).
Os Estados Unidos são apontados como o berço do comunitarismo nos anos 70, como uma reação ao projeto de renovação de liberalismo desencadeado 4
por J. Rawls através de seu livro A teoria de Justiça, publicado em 1971. Nas palavras de Semeraro: “a ‘onda’ comunitarista se apresenta como uma crítica ao individualismo, à dissolução dos vínculos familiares, comunitários e nacionais, bem com a toda visão contratualista e mercantilista introduzida na sociedade atual pelo projeto da modernidade (Semeraro, 2001: 259). Para os comunitarista, o “eu sem vínculo” dos liberais é antes de tudo um indivíduo destituído de dimensão moral e comunitária e não um sujeito livre e autônomo como defendem estes. Cabe ressaltar que os comunitaristas insistem no “bem comum”, nos deveres e na “solidariedade” para com a sociedade à qual pertencem. No comentário do autor, os comunitaristas ao contestarem as fragilidades de concepções fragmentárias e formalistas, tendem a enfatizar visões organicistas e holísticas de realidade. Com muita propriedade, Semeraro não considera as propostas comunitárias apenas como uma reação ao liberalismo, mas atribui a sua maior força a real necessidade de solidariedade e de valorização das pessoas para anular os impulsos ao anonimato e ao desinteresse predominantes no mundo de hoje que levam a desintegração crescente da sociedade atual.
Para os comunitaristas, os valores da solidariedade, da reciprocidade e os laços comunitários irão prevalecer, naturalmente, sobre as leis do mercado e a lógica da política. Nesse sentido, acrescentam que as virtudes da responsabilidade da colaboração e do altruísmo poderão constituir uma “comunidade cívica” nos termos de Putnam. Em termos práticos, uma “comunidade cívica” para o autor se caracteriza, primeiramente, pela participaçção dos cidadãos nos negócios públicos: “na comunidade cívica os cidadãos buscam o que Tocqueville chamava de ‘interesse próprio corretamente entendido’, isto é, o interesse próprio definido no contexto das necessidades públicas gerais, o interesse próprio que é sensível aos interesses dos outros” (Putnam, 2002: 102).
A comunidade cívica tem como eixo central a questão da cidadania, entendida enquanto direitos e deveres iguais para todos. A coesão no âmbito da comunidade supõe relações horizontais de reciprocidade e cooperação e não, relações verticais de autoridade e dependência. Neste sentido, os líderes devem ser responsáveis por seus concidadãos. Diz Putnam: “Tal comunidade será tanto mais cívica quanto mais a política se aproximar do ideal de igualdade política entre cidadãos que seguem as regras de reciprocidade e participam do governo”. (Putnam.2002:102). Mesmo admitindo a virtuosidade dos cidadãos numa comunidade cívica, esta não está livre de conflitos, visto que seus cidadãos têm opiniões firmes sobre as questões públicas, mas, em níveis toleráveis por parte de seus oponentes, afirma Putnam. No tocante às concepções e significados da noção de comunidade no contexto brasileiro estas se vinculam às resignificações do conceito de sociedade civil ao longo das lutas sociais e políticas no país. Neste sentido, destaca-se a análise de Gohn, que define a sociedade civil no Brasil como “uma idéia força na construção de alternativas democráticas durante o regime militar e que depois se transforma no espaço privilegiado de ações políticas mobilizatórias,voltadas para atuar em parceria com diferentes atores sóciopolíticos, em políticas sociais oficiais na esfera pública” (Gohn, 2002).
Esta análise que toma como base a conjuntura histórica, ressalta as ambigüidades das políticas sociais a partir da disseminação de estratégias de parcerias com a “comunidade organizada” e a noção de “capital social” difundidas nos anos de 1990. Esta visão privilegia as iniciativas “inovadoras” expressas nas mais diversas formas de cooperativas e ações solidárias e ainda as várias possibilidades de participação institucionalizada de cidadãos em fóruns e conselhos gestores de políticas públicas. Assim, no contexto da “reforma do Estado” a sociedade civil é articulada em torno de organizações filantrópicas e comunitárias. Mais uma vez, concordando com Semeraro (2002), reconhecemos que a visão comunitarista articula um discurso muito sedutor, cujas propostas, diz o autor: “derivam sua maior força da real exigência de solidariedade e de relações intersubjetivas, da valorização das pessoas num mundo que favorece o anonimato e o desinteresse”.
Uma retrospectiva das ações estatais e práticas mobilizatórias, ao longo das intervenções práticas, revela os diversos usos e sentidos atribuídos à noção de comunidade no Brasil. Na fase desinvolvimentista, os conceitos de comunidade e de desenvolvimento de comunidade marcaram sua história no que se relaciona à atuação dos profissionais de Serviço Social no sentido da mobilização e organização dos setores populares. Dentre os estudos realizados sobre este momento histórico, destacam-se: o de Safira Bezerra Ammann intitulado “Ideologia do Desenvolvimento de Comunidade no Brasil (1980); e o de Mariângela Belfiore Wanderley denominado “Metamorfoses do Desenvolvimento de Comunidade” (1993). Esses trabalhos levantam questões importantes sobre as práticas do desenvolvimento de comunidade na década de 1960 e início dos anos de 1970.
Entre os anos de 1960 a 1963, registra-se grande ênfase na educação popular, o que resultou na gestação de uma consciência de caráter nacional–popular e no engajamento de amplas camadas sociais na luta pelas reformas de estrutura.. No pós 1964, a integração, através da “ação comunitária” passa a ser postulada como fundamental para a harmonia do sistema, devendo ser estimulada a participação comunitária para preservar a harmonia, a continuidade e estabilização do sistema. A abordagem de comunidade é vista como um todo regido pelo consenso, com base na identificação de problemas e interesses comuns. Comunidade como unidade consensual leva a um tipo de intervenção onde os problemas são tratados não por interesse de classes, mas por grupos sociais definidos por faixa etária, sexo, etc. (Amman, 1980: 85).
Nas práticas estatais no campo das políticas sociais, destaca-se a implantação de Centros Sociais Urbanos como principal estratégia de intervenção voltada para a ação comunitária. Nos anos de 1970 e 1980, já num cenário de declínio do regime militar, o destaque em termos do entendimento de comunidade é dado pelo movimento das chamadas “Comunidades Eclesiais de Base” da Igreja Católica. Aqui a noção de comunidade ganha importância como dimensão legitimadora das iniciativas religiosas ou governamentais no plano local.
Segundo Eder Sader(1988), foi a matriz discursiva das pastorais da igreja, inspirada em Medellín, que preconizava a premência da ação, que mobilizou as CEBs em todo o país. As CEBs se multiplicaram rapidamente, alcançando em 1981 o total 80 mil comunidades de base (Sader, 1988:156) Na avaliação de Sader, os escritos sobre CEBs eram imbuídos de valores comunitários que tendiam a confundir o que “deve ser” com o “que é”. Em conseqüência, essa abordagem tende a não reconhecer diferenças e níveis de participação distintos no seu interior, visto que, trata-se de “comunidade de iguais” (Sader: 156).
O debate dos temas, na dinâmica das CEBs, seguia o método de “verjulgar-agir” das pastorais da Igreja Católica. Nessas práticas, os discursos que se sobressaem tinham como temas: o “povo”, a “igreja” e as “autoridades”. O “povo das comunidades” aparece como expressão dos sujeitos autônomos que compreendem a “caminhada da libertação”. São apontadas muitas ambigüidades nesse discurso. Com redemocratização do país no final dos anos de 1980, ocorre também o declínio da CEBs o qual se acentua nos anos de 1990, quando seus militantes passam a integrar os quadros partidários ou instituições estatais responsáveis pela formulação e execução das políticas sociais públicas.
Compreender o processo de reordenamento das políticas sociais brasileiras, a partir da década de 1990, requer uma incursão nos processos que determinaram a reforma do Estado de corte neoliberal, particularmente, no tocante às mudanças na sua relação com a sociedade. Essas mudanças se manifestam, de modo especial, na conformação de novas formas de gestão social que envolvem a presença de novos atores sociais, como parceiros do Estado, na provisão e gestão de bens e serviços sociais públicos. A literatura específica tem identificado esse processo pelo seu caráter regressivo, caracterizado no sentido de uma refilantropização no trato da questão social (Yazbek,2002). Essa interpretação ressalta, como tendência geral, a retomada de formas de intervenção social fora do registro dos direitos de cidadania o que significa um distanciamento do modelo de Seguridade Social Público desenhado na Constituição Federal de 1988. Acrescenta-se ainda nesse quadro, como dado da realidade, que o agravamento da pobreza em decorrência das transformações no mundo do trabalho vem tornando a relação entre Estado e sociedade mais complexa e contraditória. Essa constatação leva Telles (1998) a considerar, com muita pertinência, que estamos diante de uma atualização do fenômeno da pobreza pela presença dos novos “excluídos” originários da reestruturação produtiva.
Nesse contexto de acentuada desigualdade social, emergem estratégias distintas no enfrentamento da questão social, representando projetos societários diferentes na estruturação e implementação das políticas sociais públicas. Em conseqüência das ações diversificadas protagonizadas por atores sociais distintos, esse processo é tencionado pela disputa entre a defesa da universalização dos direitos sociais e a sua negação mediante a afirmação dos princípios de seletividade e focalização no atendimento às necessidades sociais. A construção do projeto de proteção social de caráter universalista vem sendo negado pela redefinição do papel do Estado sob o marco neoliberal que norteia a reforma do Estado brasileiro em curso. Trata-se de um movimento regressivo em referência a construção do sistema de seguridade social público. É, particularmente, com a entrada em cena de novos atores na prestação de serviços sociais, como representantes da sociedade que surge, nesta década, a questão da resignificação da categoria comunidade. Para Telles, este conceito assume, no contexto de redefinição das políticas sociais reconfiguradas através das parcerias, um sentido ampliado referindo-se “seja a família, sejam as organizações não governamentais, sejam as organizações filantrópicas tradicionais e suas formas modernas, aí incluindo a chamada filantropia empresarial” (Telles, 1999). Nos termos de Telles, a intervenção social protagonizada por esses atores não pode ser identificada com as velhas e tradicionais práticas de “gestão filantrópica da pobreza” porque traz inovações na forma de gestão das populações pobres, forjadas em um “encapsulamento comunitário” que ao negar os princípios universalistas de igualdade e de justiça social apaga as noções de direito e de cidadania. A contextualização dessa problemática remete a uma discussão que tem como eixo central o que vem sendo denominado, na literatura específica, de erosão da esfera pública. Entende-se que esse marco comunitarista projeta novas formas de intervenção que forjam um universo heterogêneo por onde transitam diferentes atores motivados, em sua grande maioria, por interesses particularistas. Em decorrência, a sociedade, que é redesenhada a partir desse marco, tende a ficar confinada nas particularidades que compõem esse cenário constituído pelos diferentes grupos sociais existentes o que acarreta perdas das referências totalizadoras e democráticas. Focalizando, de um modo especial, o campo das políticas sociais, é possível perceber diante das tendências em curso no contexto das mudanças na relação entre Estado e sociedade nos anos 90, um tipo de reordenamento comunitário dos programas sociais subsidiados pelos fundos públicos e mediados pelos critérios de eficiência e competição do mercado (Telles,1999). A marca dessa nova configuração das políticas sociais foi dada pelo Programa Comunidade Solidária criado pelo governo de FHC no ano de 1995. Desta forma, o PCS, embalado pelo crescimento do Terceiro Setor, teve como sustentação um viés comunitarista. Neste sentido, define sua linha de intervenção social articulada à noção de espaço público não-estatal que tem como fundamento a concepção de solidariedade no contexto da benemerência (Telles, 1998).
Afirma-se aí uma lógica de intervenção estatal norteada por uma estratégia de ação social despolitizada e consubstanciada por uma noção moral de responsabilidade, ditada como dever de solidariedade em relação aos mais pobres.
A literatura aponta como conseqüência mais imediata dessa lógica solidarista, um esvaziamento do conteúdo político da noção de espaço público, que passa a ser traduzido em termos de participação comunitária. A partir dessa concepção, neutraliza-se a esfera pública como campo político democrático de explicitação de conflitos e dissensos de negociação e interlocução em torno de questões importantes à vida em sociedade (Telles,1999).
Recentemente, no governo do Presidente Lula, o Ministério de Desenvolvimento Social está iniciando um processo de construção de um novo marco regulatório para a política de assistência, mediante a proposta de definição de um Sistema Único de Assistência Social (SUAS) que pretende adotar uma nova concepção de comunidade com base na noção de território. Mas o que se observa na prática, continua sendo a identificação da noção de comunidade à de terceiro setor.
Em síntese, a retomada do marco comunitarista no campo das políticas sociais está promovendo uma resignificação da noção de sociedade civil, na medida em que esta vem sendo esvaziada de sua dimensão política na perspectiva de construção de espaços públicos, para afirmar o que Vera Telles
muito adequadamente, denomina de “encapsulamento comunitário” pelo qual as ações coletivas locais são circunscritas de acordo com as particularidades dos diversos grupos sociais envolvidos.

Bibliografia:

AMMANN, S. B. Ideologia do Desenvolvimento de Comunidade no Brasil. São Paulo: Cortez Editora,1980.

BAUMAN, Z. Em Busca da Política. Rio de Janeiro:Jorge Zahar Editor,2000.

BELFIORE-WANDERLEY, M. Metamorfoses do Desenvolvimento de Comunidade. São Paulo: Cortez Editora, 1993.

CARAPINHEIRO, G. A Globalização do Risco Social. In SANTOS, B. de S. (org.). A Globalização e as Ciências Sociais. São Pailo: Cortez Editora, 2002, pp. 197-230.

GOHN, M. G. Políticas Públicas e Sociedade Civil no Brasil nas últimas décadas. In CARVALHO, D. B. B. et al. Novos Paradigmas da Política Social. Brasília: UNB. Departamento de Serviço Social, 2002.

KOGA, D. Medidas de Cidades: entre territórios de vida e territórios vividos. São paulo, Cortez Editora, 2003.

PUTNAM, R. D. Comunidade e Democracia – a experiência da Itália moderna. Rio de Janeiro: FGV Editora, 3ª ed. 2002.

SADER, E. Quando Novos Personagens entraram em cena. Rio de Janeiro:
Paz e Terra, 1988.

SEMERARO, G. Gramsci e a Sociedade Civil. Petrópolis: Editora Vozes, 2001, 2ª ed.

TELLES, V. A Nova Questão Social Brasileira. In Praga – estudos marxistas 6. São Paulo: Editora Hucitec, 1998 pp. 107-116.

YAZBEK, M. C. Assistência Social e Filantropia. In CARVALHO, D. B. B. et al. Novos Paradigmas da Política Social. Brasilia: UNB, Departamento de Serviço Social, 2002.

Ecologia Política: Guerreiro Ramos e Fritjof Capra




SÉRGIO LUÍS BOEIRA (*)



(*) Doutor em Ciências Humanas (UFSC), professor de ecologia política, no curso de ciência política, e pesquisador do mestrado em administração da Universidade do Vale do Itajaí (SC)




INTRODUÇÃO


Este ensaio tem por objetivo contribuir com a ecologia política por meio da síntese comparativa de duas obras de pensadores ambientalistas publicadas no início da década de 1980. A Nova Ciência das Organizações, de Alberto Guerreiro Ramos, e O Ponto de Mutação, de Fritjof Capra, estão entre os clássicos do pensamento ecopolítico.
A hipótese central deste trabalho é que os autores, apesar de suas diferentes áreas acadêmicas de base, chegaram a resultados muito semelhantes a partir de um mesmo paradigma emergente, contribuindo de forma decisiva com a formação do campo de pesquisa trans-disciplinar que é a ecologia política. Capra, físico, epistemólogo (com incursões nas ciências sociais, na ecologia, na psicologia e na administração), e Ramos, um dos pioneiros da sociologia brasileira (com formação também filosófica , incursões na psicologia, na administração, na ecologia e com experiência político-parlamentar), podem ser considerados dois constituintes da ecologia política, sem que esta expressão seja utilizada por eles diretamente.
Nem Capra menciona Ramos, nem este cita Capra.

Este último é austríaco e vive nos Estados Unidos, tendo sua obra atingido repercussão mundial. Ramos, brasileiro, faleceu em 1982, após ter lecionado nos Estados Unidos (Universidade da Califórnia do Sul, Yale University e Wesleyan University) e publicado dez livros e numerosos artigos (em inglês, francês, espanhol e japonês). Sua principal obra, aqui examinada, também foi publicada pela Universidade de Toronto, em inglês, em 1981. Ramos também lecionou na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC).

Autores como Jean-Pierre Dupuy (1980), André Gorz (1980), Jean Dorst (1973), Cornelius Castoriadis e Daniel Cohn-Bendit (1981), Edgar Morin (1973), Lester Brown (1983), Karl Deutsch (1977), Kenneth Boulding (1978), Ronald Inglehart (1977), Herman Daly (1977), Georgescu-Roegen (1971), John Galtung (1977), Arnold Toynbee (1979), William Ophuls (1977), Gregory Bateson (1986), Ignacy Sachs (1986), Lester Milbrath (1984), Barry Commoner (1980), Paul Ehrlich (1968), Ivan Illich (1976), E.F. Schumacher (1983) e Roger Garaudy (1979) estão entre os pioneiros da ecologia política entre a década de 1950 e meados dos anos 80[1]. José Augusto Pádua encontra indícios da ecologia política no debate sobre o projeto nacional brasileiro desde o início da colonização européia (Pádua, 1987). Com efeito, antes da vertente acadêmica posterior à década de 1950, pode-se encontrar já em Platão, há 2.400 anos, uma crítica ambientalista ao desmatamento e à erosão do solo decorrente do excesso de pastagem. Mas as raízes de um movimento coletivo de defensores do meio natural são discerníveis na Grã-Bretanha na década de 1860. Tal movimento diversifica-se (preservacionismo, conservacionismo)[2], espalha-se durante a primeira metade do século XX e politiza-se rapidamente desde os anos 60, gerando, inclusive, diversos partidos verdes na década de 1970 (McCORMICK, 1992). No Brasil, Eduardo Viola faz uma análise ecopolítica e um resgate histórico do movimento (1987; 1992). Depois da Conferência Rio-92 houve diversificação e complexificação da agenda ecopolítica. Isto significa dizer que os autores e obras aqui examinados, para serem compreendidos, precisam ser vistos no contexto da primeira metade dos anos 80.

Entretanto, no contexto difuso das idéias ambientalistas, Fritjof Capra e Guerreiro Ramos encontram-se entre aqueles autores que abordam a variada temática da ecologia política desde um ponto de vista inovador, tanto com relação à trajetória histórica da ecologia quanto da ciência política ou das ciências sociais em geral. Trata-se de uma travessia trans-disciplinar e sistêmica entre ciências naturais e humanas ou sociais, uma reorientação paradigmática das mesmas. Evidentemente, não são os únicos nem, necessariamente, os que melhor fizeram tal travessia. Esta reorientação paradigmática abrangente não é obra de uns poucos autores e muito menos aconteceu de forma isolada. Também não é algo de curto ou médio prazo, mas que requer décadas, conforme se pode depreender tanto da obra de Thomas Kuhn (1962), que iniciou o debate acadêmico sobre as revoluções paradigmáticas, quanto de Edgar Morin (1991), que há pelo menos três décadas vem tratando do tema. Com isto quero justificar a opção por fazer um estudo comparativo, integrativo e analítico sobre autores e obras que estão compondo a ecologia política na medida em que transcendem suas áreas disciplinares convencionais e se aventuram em um novo paradigma científico, também em construção.

A opção pelas obras de Capra e Ramos vem de uma afinidade eletiva de meados dos anos 80, que amadureceu criticamente com o passar dos anos[3]. Certamente, entre outros autores ambientalistas um trabalho semelhante a este poderia ser realizado, aprofundando-se o conhecimento sobre padrões de idéias trans-disciplinares emergentes sob o paradigma da complexidade, em contraposição ao disjuntor-redutor, para usar a terminologia de Morin. Em vez de contribuir com a ecologia política, uma outra comparação neste estilo poderia resultar em contribuição com a economia ecológica, se fossem examinadas obras de, por exemplo, Kenneth Boulding, Herman Daly, Georgescu-Roegen ou Ignacy Sachs (ver a propósito ALIER & SCHLÜPMANN, 1991). Nem a ecologia política, nem a economia ecológica, com efeito, ainda que tenham e desenvolvam muitas interfaces entre si, não abrangem toda a complexidade do paradigma que as sustentam. Esta observação é tanto mais relevante quanto mais disciplinas acadêmicas influenciadas pelo ideário ambientalista - engenharia ambiental, direito ambiental, educação ambiental, jornalismo ambiental, etc - tomam forma específica e aparentemente autônoma em relação ao debate epistemológico nas universidades e institutos de pesquisa. Há um risco de “normalização” (Kuhn) e “simplificação” (Morin) do pensamento ecológico para fins acadêmicos ou mesmo mercadológicos. Longe de ter sido concluído por Kuhn, o debate epistemológico merece uma paradigmatologia, cuja principal contribuição está, a meu ver, no quarto volume da série sobre La Méthode (MORIN, 1991).
Nesta obra, o autor afirma que, para todos os discursos que se efetuam sob o seu domínio, um paradigma contém os conceitos fundamentais, ou as categorias mestras da inteligibilidade e, ao mesmo tempo, o tipo de relações lógicas de atração/repulsão (conjunção, disjunção, implicação ou outras) entre estes conceitos ou categorias. Assim, “os indivíduos conhecem, pensam e agem segundo os paradigmas inscritos culturalmente neles. Os sistemas de idéias são radicalmente organizados em virtude dos paradigmas.” (MORIN, 1991:188).
Partindo deste pressuposto, e como método para uma síntese comparativa, optei por destacar alguns tópicos temáticos na medida em que, no conjunto destes, percebi um parâmetro comum que possibilitava uma comparação que, de certa forma, também implicava num relativo reducionismo. Nem tudo pode ou merece ser comparado, apenas os temas mais relevantes e comuns entre as obras. Os tópicos são os seguintes:

1. Sociedades Industriais;
2. Diante de Marx;
3. Economia;
4. Enfoque Epistemológico;
5. Sistemas de Valores;
6. Tecnologia e Recursos Naturais;
7. Espaço, Tempo, Psicologia e Pequenos Grupos.

A seguir, à guisa de introdução, faço um resumo do que adiante será examinado.

1. Tanto Capra quanto Ramos fazem críticas contundentes e consistentes às sociedades industriais nascidas da Revolução Industrial no século XVIII. Eles partem, porém, de ângulos um pouco diferentes e enfatizam diferentes aspectos. Ambos fazem a crítica do Iluminismo. Ramos identifica nele a instituição da razão instrumental e Capra, o mecanicismo. Há uma nítida familiaridade entre eles, uma vez que a razão instrumental desequilibra a mente humana no sentido da valorização unilateral do que é útil exclusivamente ao indivíduo, e os pressupostos mecanicistas separam corpo e mente, concebendo o Universo como uma imensa máquina.
2. Os dois autores referem-se a Marx com muito cuidado, embora o marxismo não seja o tema central de suas análises. Ramos afirma que Marx foi influenciado pelo Iluminismo ao atribuir à história uma racionalidade que só é realmente passível de realização por seres individuais. Capra vê um Marx não-materialista, que se aproxima da cultura emergente em muitos aspectos. Há, porém, um desacordo básico entre os referenciais de Marx e os de Capra. A violência na história é a questão central que os afasta. Capra mostra que os conflitos acontecem num contexto de complementação e cooperação.
3. A economia é um dos temas que mais aproxima as duas obras e os autores em questão. Ambos criticam a supervalorização da dimensão econômica e a expansão totalitária dos valores de mercado. Têm em E.F. Schumacher um referencial comum. Defendem a economia dual, cooperativista e o valor de uso . o que implica em descentralização (ênfase de Capra) e delimitação (ênfase de Ramos) do espaço-tempo da vida econômica. A regulamentação da economia por uma política ecológica (ou ecologia política) é o ponto básico e comum entre eles.
4. Quanto ao enfoque epistemológico, cabe destacar que a ciência é compreendida pelos autores como uma atividade que exige sobretudo equilíbrio entre razão e intuição. Contestam fortemente os fundamentos da ciência contemporânea, propondo e construindo um novo paradigma, chamado de paraeconômico por Ramos e de sistêmico por Capra. Ambos tomam como referência a teoria geral dos sistemas (Bertalanffy).
5. Valores ecológicos, no sentido da reflexão ética, são um ponto de partida para a ciência crítica e para a política. Os autores defendem a prioridade da mudança no sistema de valores como fator de mudança social e histórica. A normatividade da razão é enfatizada por Ramos, e a aproximação com o misticismo é enfatizada por Capra. A integração, a dinamicidade, a criatividade, o equilíbrio e a auto-organização nos contextos naturais são alguns dos valores comuns entre ambos. Ramos sugere permanência e Capra sugere ordem, em sentidos nada convencionais.
6. A relação entre tecnologia e recursos naturais é algo que aproxima muito os autores a partir de um referencial comum na ecologia. Ambos defendem a utilização parcimoniosa e racional dos recursos não-renováveis, assim como a utilização urgente e intensa de tecnologias brandas, de baixo impacto ambiental. Capra vai mais longe e faz um breve apanhado destas tecnologias (suaves) existentes, além de anunciar o surgimento de outras a partir de descobertas científicas. Ele entende que estamos em transição (certamente de longo prazo) para a Idade Solar (com o predomínio da utilização da energia solar sobre as demais).
7. Indivíduos e pequenos grupos são os agentes de mudança social, ao lado da articulação de um novo sistema de valores. No entanto, Ramos preocupa-se com os cenários e os sistemas sociais aptos à cultura emergente, enquanto Capra percebe a necessidade de mostrar as interconexões dos propósitos de vários movimentos sociais e mudanças acadêmicas. Capra imagina que esta percepção de novos valores, se contar com uma reestruturação coerente, poderá deflagrar uma rápida mudança de paradigma social, a qual seria acompanhada de mudanças sociais efetivas e imprevisíveis. Os dois autores tomam como referência C.G. Jung, entre muitos outros autores que também concebem a não-separatividade (ou articulação mecânica) entre espaço e tempo. Percebem uma tensão entre o cosmos e o social. A socialização, para ambos, é um desafio permanente.

DESENVOLVIMENTO COMPARATIVO DOS TÓPICOS TEMÁTICOS

1. Sociedades Industriais.

Alberto Guerreiro Ramos fundamenta sua análise crítica das sociedades centradas no mercado (industriais) fazendo, inicialmente, uma crítica da razão moderna e sua influência sobre a teoria da organização. Analisa as diferentes posições de Max Weber, de Karl Mannheim, da Escola de Frankfurt, e de Eric Voegelin. Conclui concordando com muitos pontos observados pelos autores, porém demonstrando insatisfação diante da falta de sistematicidade das alternativas por eles levantadas. Lança, com isto, um desafio a si mesmo: o de preparar o caminho para uma .nova ciência das organizações.. Ramos pretende ir além da desmontagem crítica e histórica da razão instrumental. Pretende construir um modelo de delimitação de sistemas ou cenários sociais com base na razão substantiva. A racionalidade instrumental, para ele e outros, consolidou-se como desequilíbrio em favor do cálculo e do .utilitarismo. a partir dos séculos XVII e XVIII. Ramos identifica Hobbes, Bacon e Adam Smith como protagonistas dessa articulação. Estes autores estão para Ramos como Descartes, Newton e o próprio Bacon estão para Capra. Todos fazem parte da cultura moderna, do culto à razão acima de todas as coisas (processos). Há certa generalização excessiva dos autores na crítica ao Iluminismo, na medida em que desprezam a heterogeneidade deste, reduzindo-o à razão instrumental ou ao mecanicismo. Nem Capra nem Ramos desenvolvem uma teoria sistemática do Iluminismo, adotando uma abordagem um tanto impressionista do mesmo[4]. No entanto, é inegável que o racionalismo clássico-moderno, enquanto suporte do industrialismo, confirma as impressões dos autores. A razão instrumental tem dominado a teoria da organização, levando-a a um sucesso pragmático, porém ingênuo, segundo Ramos. Tem exercido um impacto desfigurador sobre a vida humana associada. Basicamente, Hobbes define a razão como uma capacidade adquirida através de esforço e como uma habilidade para fazer o cálculo utilitário de conseqüências. Ele pretendeu despojar a razão de qualquer papel normativo no domínio da construção teórica e da vida humana associada. A forma encontrada pela sociedade centrada no mercado (mercadocêntrica) para absorver a palavra razão foi torná-la compatível com a estrutura social normativa, utilitária, calculista. Até o século XVII, a razão era predominantemente normativa. Depois, a normatividade da razão foi gradualmente substituída pela normatividade da história e da estrutura socioeconômica. A razão dos indivíduos foi reduzida ao controle dos instintos, à dedução (como desequilíbrio contra a indução) e aos interesses estimulados pela sociedade mercadocêntrica. Ramos parece concordar com Karl Mannheim e Max Weber na definição possível da racionalidade substantiva. Trata-se de um ato de pensamento que revela .percepções inteligentes das inter-relações de acontecimentos. (MANNHEIM, 1940:58) numa determinada situação. Esta racionalidade constitui, diz Ramos, a base da vida humana ética, responsável. A razão substantiva não depende de suas expectativas de sucesso. Capra discute e critica o paradigma mecanicista que, como se verá, é familiar à razão instrumental. O autor parte da física das altas energias e, no livro O Tao da Física, mostra o paralelo que há entre as descobertas recentes da ciência e o misticismo de todas as épocas e tradições, particularmente o oriental. Isto evidentemente não significa que o autor esteja confundindo a ciência com o misticismo, embora seja um aspecto vulnerável a críticas vindas da filosofia. No Ponto de Mutação, Capra vai mais longe, analisando a penetração do paradigma mecanicista em muitas áreas, além da física. O autor afirma que enquanto a nova física se desenvolvia no século XX, a visão de mundo cartesiana e os princípios da física newtoniana mantinham sua forte influência sobre o pensamento científico ocidental, e .ainda hoje muitos cientistas aderem ao paradigma mecanicista, embora os próprios físicos o tenham superado. (CAPRA, 1982:95). A partir desta colocação, o autor analisa as mudanças surgidas entre 1950 e 1980, detendo-se muito na biologia, na medicina, na economia e na psicologia. O reducionismo mecanicista tem provocado inúmeras crises em todas estas áreas, mas Capra identifica as .crises setoriais. como uma única crise de percepção. Ao contrário do que afirmam Descartes e Newton, o corpo e o Universo não são basicamente máquinas, não estão separados da mente, e o essencial na realidade é constituído por suas interligações (inter-relações) e por sua dinamicidade. O mecanicismo defendia a existência de unidades básicas isoláveis . os átomos. Porém, a física subatômica só encontrou relações, ritmos e unidade entre processos, ondas, intensidades . fenômenos essencialmente dinâmicos. Não encontrou quaisquer unidades .isoláveis., quaisquer partículas básicas, fundamentais, sólidas. O mecanicismo, assim, tornou-se obsoleto, e com ele os valores que o tornaram possível. Ora, se a razão instrumental pôde consolidar-se e tornar-se dominante . isto ocorreu a visão de mundo mecanicista e industrialista, porque somente neste caso o ser humano poderia usar a natureza como um objeto isolável, passível de cálculo utilitário. Desta forma, as duas obras, de Capra e Ramos, complementam-se num esclarecimento de via dupla: a crítica à razão instrumental consolida a crítica ao mecanicismo e vice-versa. Paralelamente a isto, a razão substantiva ganha referenciais nos místicos e na concepção sistêmica da vida. Ora, se o pensamento substantivo caracteriza-se pela percepção das interconexões entre acontecimentos numa determinada situação . este pensamento aproxima-se das descobertas da teoria da relatividade, da teoria quântica e, também, do misticismo...E este misticismo, visto não só por Capra, mas também por outros físicos, aproxima-se da razão normativa, que é substantiva, é fonte de percepção ética, afetiva, responsável e sem dependência de suas expectativas de sucesso. Enfim, um equilíbrio dinâmico entre razão e intuição parece exprimir o centro das conclusões dos dois autores. Entretanto, cabe observar que há uma certa tendência idealista dos autores na sua leitura da tradição, como contrapartida de sua visão realista e crítica da modernidade. Em Capra, especialmente, nota-se ausência de uma leitura mais filosófica e menos impressionista do misticismo e/ou da espiritualidade.

2. Diante de Marx.

Ramos inclui este autor na cultura iluminista, mas referencia-se na obra marxista, particularmente na obra de Habermas. A certa altura, afirma que .na perspectiva do Iluminismo, o mundo é descrito em fórmulas matemáticas, e o desconhecido perde seu transcendente significado clássico (no sentido dos gregos da Antigüidade), tornando-se alguma coisa relativa às capacidades de cálculos disponíveis. (Ramos, 1981:09). Logo depois, Ramos faz uma de suas melhores sínteses de sua posição diante de Marx: .Apesar das proclamações 'dialéticas. de Karl Marx, que pretendeu ter despojado o racionalismo do século XVIII de seus traços mecanicistas, seu conceito de razão está profundamente enraizado na tradição do Iluminismo, na medida em que ele acreditava que o processo histórico das forças de produção é racional em si mesmo e, portanto, emancipatório. Isso é uma ilusão, afirma a Escola de Frankfurt, e Habermas, em especial, ocupa-se sistematicamente com esta questão. (RAMOS, 1981:09). Capra também recusa o referencial marxista, mas por diferentes motivos dos de Ramos, e menos enfaticamente do que este. Marx acreditava que .as raízes da evolução social não se situam numa mudança de idéias ou valores, mas nos fatos econômicos e tecnológicos. (CAPRA, 1982:31). Isto assinala uma das discordâncias do autor em relação a Marx. Os sistemas de valores são o contexto dos fatos econômicos e tecnológicos, já que nem a economia nem a tecnologia são passíveis de neutralidade. Mas a divergência maior está na ênfase dada pelos marxistas ao conflito, à luta. A idéia da vida como uma luta constante pela existência, que tanto Darwin quanto Marx ficaram devendo ao economista Thomas Malthus, foi vigorosamente promovida no século XIX pelos darwinistas sociais que influenciaram, se não Marx, certamente muitos de seus seguidores. .Creio que sua visão da evolução social enfatiza exageradamente o papel da luta e do conflito, esquecendo o fato de que toda luta ocorre na natureza dentro de um contexto mais amplo de cooperação. (CAPRA, 1982:32). Este .contexto mais amplo. é percebido com outros referenciais, além das descobertas recentes da física: idéias de Toynbee sobre a ascensão e queda das civilizações; a antiga noção de um ritmo universal básico, que resulta em padrões culturais flutuantes; a análise de Sorokin da flutuação dos sistemas de valores; e o ideal de transições culturais harmoniosas retratado no I Ching. No entanto, Capra também elogia a obra de Marx, considerando-a um referencial dos mais significativos para toda análise crítica das sociedades industriais. Afirma que suas idéias e teorias não são exclusivamente deterministas e materialistas. Reconhece, inclusive, um Marx com uma concepção orgânica e sistêmica da realidade. Cita um trecho dos Manuscritos Econômicos e Filosóficos em que Marx mostra sua percepção das interconexões entre o homem e a natureza, vida física e espiritual (Capra, 1982:199). Apesar de perceber, tal como Ramos, a forte influência da linguagem matemática (iluminista) sobre Marx, Capra parece disposto a recuperar o máximo possível da obra marxista. E nisto se difere mais uma vez de Ramos. .O conhecimento ecológico. . diz Capra . .é sutil e dificilmente pode ser usado como base para o ativismo social, uma vez que as outras espécies . sejam elas as baleias, as sequóias ou os insetos . não fornecem energias revolucionárias para que se mudem as instituições humanas. Foi provavelmente por isso que os marxistas ignoraram por tanto tempo o Marx ecológico. Estudos recentes trouxeram à luz algumas das sutilezas do pensamento organicista de Marx, mas elas não interessam à maioria dos ativistas sociais, que preferem organizar-se em função de questões mais simples. Talvez por isso Marx tenha declarado no final de sua vida: não sou marxista. (CAPRA, 1982:200). Em todo caso, dada sua formação acadêmica, parece claro que Capra não conhece profundamente a ampla obra marxista.[5]

3. Economia.

Os dois autores são críticos contundentes da economia, tal como tem sido considerada, principalmente depois da revolução industrial. Para eles, as atividades econômicas devem estar subordinadas a certas diretrizes da ecologia política, que visam o equilíbrio dinâmico entre sociedades humanas e o meio ambiente, o qual implica um equilíbrio dinâmico no interior das sociedades humanas. Portanto, equilíbrio dinâmico é uma expressão central, enfatizada principalmente por Capra. Ramos não tem ilusão a respeito de uma sociedade ideal, sem conflitos, e por isso dedicou-se à elaboração de cenários ou sistemas sociais, sendo a economia apenas um entre eles. A economia de base industrial (seja capitalista ou socialista) pressupõe a infinitude dos recursos naturais, o que é um erro central e trágico. A economia dos países industrialmente mais desenvolvidos não poderá continuar servindo de modelo para os outros países, simplesmente porque não haverá recursos naturais em quantidade suficiente. A escassez ecológica é, por isso, uma raiz oculta da inflação. .Oculta. porque não é percebida no interior do paradigma mecanicista. Os dois autores concordam em todas as suas observações a respeito da economia de base industrial. São favoráveis à economia dual, isto é, .'a coexistência de sistemas de orientação mutuária . nos quais os respectivos membros produzem para si mesmos uma grande parte dos bens e serviços que diretamente consomem . e de sistemas orientados para o lucro, os membros são, essencialmente, detentores de empregos. (RAMOS, 1981:188). No entanto, a economia dual pressupõe um sistema de valores nãoexpansionistas, não tanto yang, e sim mais ying, integrativos e convergentes. Ou seja, o próprio lucro deverá perder seu caráter particular, compulsivo, e tornar-se social, eticamente aceitável. Lucro coletivo ou social.

Uma das razões pelas quais o conceito de lucro se tornou tão distorcido é a divisão artificial da economia em setores público e privado, o que levou os economistas a ignorar o vínculo entre lucros privados e custos públicos. Os papéis relativos dos setores público e privado no suprimento de bens e serviços estão sendo cada vez mais questionados, com um número crescente de pessoas perguntando-se por que devemos aceitar a necessidade de indústrias de muitos milhões de dólares dedicadas a alimentos para cachorros, cosméticos, remédios e toda sorte de aparelhos que esbanjam energia, quando nos é dito, ao mesmo tempo, que não dispomos de recursos para dotar nossas cidades de transportes públicos adequados.” (CAPRA, 1982:222)

Voltando a Ramos: .Os sistemas de orientação mutuária e o setor de troca não são reciprocamente excludentes. Devem ambos ser sistematicamente estimulados, por meio de uma eficiente utilização de transferência (de recursos) num só sentido ou em duplo sentido, para benefício da sociedade em geral. (RAMOS, 1981:188). Um exemplo pode deixar isto mais claro: a reciclagem de lixo urbano pode gerar recursos financeiros e educação para grupos de pessoas que e com tal atividade podem fornecer recursos materiais para empresas, evitando, assim, a exploração desnecessária de recursos naturais. Este é um caso que ilustra a teoria do ecodesenvolvimento, com a qual concordam, implicitamente, os dois autores (SACHS, 1986a; 1986b). Para esta teoria, as tecnologias de baixo impacto ambiental e a harmonia entre produção local e consumo local são pontos básicos. Capra prevê três pontos chaves numa possível transição bem-sucedida: 1. Declínio do patriarcado; 2. Declínio da era do combustível fóssil; 3. Mudança de paradigma. Todos esses pontos têm íntima relação com a política econômica a ser acelerada e implementada: 1. Valorização do trabalho doméstico e feminino em geral; 2. Técnicas suaves; pesquisas ecológicas sobre fontes de energias e incentivo às técnicas deste tipo voltadas para a descentralização do poder . como a energia solar, eólica, com biomassa, etc; 3. Articulação coerente dos valores que estão emergindo à parte do paradigma mecanicista. Percebe-se, portanto, que a economia verde requer sobretudo novos valores, razão substantiva, normatividade equilibrada entre tendência yang e ying (expansão e integração). Enfim, a Economia Budista de E.F. Schumacher. Isto implicaria em reformulação de todos os atuais conceitos dominantes da macroeconomia. Por exemplo: o Produto Interno Bruto (PIB) deveria considerar os custos sociais e ecológicos da descapitalização da natureza; a moeda não deveria ser a única variável para medir a eficiência dos processos de produção e distribuição; o valor de uso e, portanto, as trocas diretas seriam reconsideradas como aspectos significativos da economia, etc. Finalmente, cabe ressaltar que os autores propõem o fim da economia como base predominante da política nacional. Capra insiste em que os problemas econômicos requerem equipes multidisciplinares, principalmente porque os aspectos relacionados à produção de energia estão tornando-se centrais na economia. A descentralização do poder, de acordo com as peculiaridades ecossistêmicas e bacias hidrográficas, requer a aproximação das ciências humanas às ciências ditas naturais ou exatas.

4. Enfoque Epistemológico

As conclusões de Ramos sobre a razão, resumidas anteriormente, o levaram à crítica da teoria organizacional dominante. Esta deixa, sistematicamente, de distinguir entre razão substantiva e razão instrumental (não percebendo diferenças entre organização formal e substantiva); não compreende o papel da interação simbólica nas relações interpessoais em geral; e apóia-se numa visão mecanomórfica da atividade produtiva do ser humano. Esta última observação faz a ponte com a crítica de Capra à visão mecanicista da vida. Para ambos, toda ciência que se baseia exclusivamente nesse tipo de visão não passa de um credo. A concepção sistêmica inclui . e até certo ponto dilui . a concepção mecanicista. Trata-se não de substituição, mas de recontextualização. O mesmo é válido para a relação estabelecida entre razão substantiva e instrumental, como se percebe na proposta de ciência feita por Ramos. Partindo da crítica à teoria da organização, ele inicia a composição de uma teoria da delimitação dos sistemas sociais . que ele também chama de modelo multidimensional, em contraposição ao unidimensionalismo da teoria dominante. O ponto central do modelo multidimensional de Ramos é a noção de delimitação organizacional que envolve: a) uma visão da sociedade como sendo constituída de uma variedade de enclaves (dos quais o mercado é apenas um), onde o homem se empenha em tipos nitidamente diferentes, embora verdadeiramente integrativos, de atividades substantivas; b) um sistema de governo social capaz de formular e implementar as políticas e decisões distributivas requeridas para a promoção do tipo ótimo de transações entre tais enclaves sociais (RAMOS, 1981:140). Quanto ao primeiro dos fatores acima, o autor destaca e desenvolve os seguintes tópicos: a) orientação individual e comunitária; b) prescrição contra ausência de normas. Depois compõe a .conceituação das categorias delimitadoras., que são: anomia e motim, economia, isonomia, fenonomia, isolamento. A complexidade de tal modelo inviabiliza um tratamento particularizado aqui, o que subverteria o propósito de uma síntese comparativa. Capra, mais explícita e enfaticamente do que Ramos, define-se pela teoria geral dos sistemas (BERTALANFFY, 1968; BUNGE, 1980; BUCKLEY, 1967). Ele dá continuidade às conclusões de seu livro imediatamente anterior, O Tao da Física (de 1975). Considera, por exemplo, .a filosofia Bootstrap como a culminação do pensamento científico contemporâneo. (CAPRA, 1982:236). O criador do termo .bootstrap. (literalmente, .presilha de bota., metáfora da autoconsciência) foi Geoffrey Chew. Este e outros autores, físicos e místicos, concebem a não-separatividade entre observador e evento observado. Esta idéia pode revolucionar o estudo da matéria, pelo fato de a própria presença do pesquisador implicar a mudança do objeto analisado. Uma nova noção de ordem é percebida a partir da concepção sistêmica. Diz Capra: .O elemento-chave da filosofia bootstrap é a noção de ordem como um aspecto novo e importante da física das partículas. A ordem, nesse contexto, significa ordem no estado de interligação dos processos subatômicos. Há várias maneiras pelas quais as reações das partículas podem interligar-se e, de acordo com isso, definir várias categorias de ordem. (CAPRA, 1983:236). A capacidade para reconhecer ordem parece ser um aspecto essencial da mente racional. Toda percepção de um padrão é, num certo sentido, uma percepção de ordem. O esclarecimento do conceito de ordem num campo de pesquisa em que .os padrões da matéria e os padrões da mente estão sendo reconhecidos, de modo crescente, como reflexos um do outro, promete-nos, assim, abrir fascinantes fronteiras ao conhecimento. (CAPRA, 1983:237). Também David Bohm é considerado um desbravador de idéias e descobertas na física, ao fazer .um bootstrap do espaço-tempo, juntamente com alguns conceitos fundamentais da teoria quântica, a fim de derivar daí uma consistente teoria quântico-relativística da matéria. (CAPRA, 1983: 237). Em resumo, pode-se dizer que experimentos deste tipo, na física subatômica, estão possibilitando uma nova maneira de pensar, que é simultaneamente racional e global, e caracteriza-se por perceber as interconexões dos fenômenos numa determinada situação. Mais significativo, aqui, é mostrar as relações que Capra faz entre as descobertas da física e as instituições sociais sob o novo paradigma do que mostrar como ele relacionou aquelas descobertas ao misticismo. O autor sinaliza a .formulação gradual de uma rede de conceitos e modelos interligados e, ao mesmo tempo, o desenvolvimento de organizações sociais correspondentes. Nenhuma teoria ou modelo será mais fundamental do que o outro, e todos eles terão que ser compatíveis. Eles ultrapassarão as distinções disciplinares convencionais, qualquer que seja a linguagem comprovadamente adequada para descrever diferentes aspectos da estrutura interrelacionada e de múltiplos níveis de realidade. Do mesmo modo, nenhuma das novas instituições sociais será superior ou mais importante do que qualquer uma das outras, e todas elas terão que estar conscientes umas das outras e se comunicar e cooperar entre si. (CAPRA, 1982:259). Capra analisa o funcionamento de modelos e organizações desse tipo que surgiram recentemente. Ele não está tratando de algo abstrato e distante. Nem Ramos faz especulações sobre um futuro desejável, mas relaciona seus conceitos delimitativos com experiências concretas de grupos ainda marginalizados nas sociedades centradas no mercado. Há, particularmente na área da saúde, uma série de experiências que combinam fenonomia, economia, isonomia, por exemplo. A rede de conceitos formulada por Ramos (isonomia, fenonomia, economia, etc) é um início, como ele próprio afirmou, de uma nova ciência das organizações. A obra de Capra confirma as idéias de Ramos, enfatizando, porém, a necessidade de se estudar as organizações de várias espécies, não apenas a humana. A ciência, para os autores, não pode dispensar posicionamentos políticos e valorativos (recontextualizações integrativas), embora a relação dialógica entre ciência e política não tenha sido solucionada por eles (isto pressuporia uma revolução paradigmática que ainda é apenas potencial). A ciência redimensiona e cria conceitos incessantemente, aproximando-se sobretudo de forma existencial, pessoal e parcial à realidade, considerada dinâmica e multifacetada. Justamente por essa dinamicidade e .interdependência essencial de todos os fenômenos . físicos, biológicos, psicológicos, sociais e culturais. (CAPRA, 1982:259) é que a neutralidade axiológica deixou de ser um horizonte científico. Mesmo assim ela tem sido levada adiante pela chamada tecnociência, geralmente para fins comerciais (MORIN & KERN, 1995). Ramos, ao contrário do que se poderia imaginar a partir de uma leitura superficial de sua teoria da delimitação dos sistemas sociais, não pretende ver compartimentalização nas sociedades. A ênfase de Ramos sobre a necessidade de normatividade social está calcada numa crítica à síndrome comportamentalista, isto é, à redução da ação humana ao comportamento. A normatividade do autor não é imposta aos indivíduos por critérios de convivência social, mas é uma possibilidade de convivência entre indivíduos autônomos, com referenciais que transcendem os interesses de caráter simplesmente utilitário. Estes referenciais são metahistóricos, cosmológicos. A sociedade moderna, continua ele, não se reconhece como .miniatura de um cosmos maior, mas como um contrato amplo entre seres humanos. Assim, a conduta humana se conforma a critérios utilitários que, a seu turno, estimulam a fluidez da individualidade. Na verdade, o homem moderno é uma fluida criatura calculista, que se comporta, essencialmente, de acordo com regras objetivas de conveniência. (RAMOS, 1981:54). O deslocamento da fé do cosmos para o social tem impedido os seres humanos de aprenderem com a natureza. Capra procura furar esse bloqueio histórico, na busca de inspiração para articular e propor um novo paradigma social: .A sabedoria sistêmica baseia-se num profundo respeito pela sabedoria da natureza, a qual é totalmente compatível com os insights da ecologia moderna. (CAPRA, 1982: 382). O ambiente natural consiste em ecossistemas habitados por incontáveis organismos que coevoluíram durante bilhões de anos, usando e reciclando continuamente as mesmas moléculas de solo, água e ar. Os princípios organizadores desses ecossistemas podem ser considerados superiores aos das tecnologias humanas baseadas em invenções recentes. Para Capra, o meio natural não é só vivo, mas também inteligente: .A inteligência dos ecossistemas, em contraste com tantas instituições humanas, manifesta-se na tendência predominante para estabelecer relações de cooperação que facilitam a integração harmoniosa de componentes sistêmicos em todos os níveis de organização. (CAPRA, 1982:382). Pode-se concluir, do que foi dito por ambos, que o paradigma social emergente é metahistórico (considerando-se o corte instituído entre história humana por um lado, e, por outro, história natural e a tradição mítica). Além disso é ecossocial. Ora, isto implica em uma profunda reformulação dos valores que contextualizam a ciência, além de uma compreensão muito clara de que as sociedades humanas não só não estão acima da natureza . como imaginavam os primeiros industrialistas . como têm muito que aprender com as fórmulas pelas quais a natureza exibe tanta dinamicidade e capacidade de perdurar.

5. Sistemas de Valores

Capra e Ramos têm muitos valores em comum. Por exemplo: ecologia (qualidade de vida, pós-materialismo), paz, autodeterminação, integração, associativismo, ética humanitária e responsável, flexibilidade (mental, econômica e social), saúde (psíquica, corporal e ambiental interdependentes), sentido evolutivo, permanência, ordem, não-expansionismo, ciência, arte, diversidade cultural, relatividade e paradigma emergente. Ramos imaginava uma sociedade capaz de permanecer, de durar, em vista de sua parcimônia na utilização dos recursos naturais não-renováveis e na capacidade de harmonizar e delimitar organizações pequenas, não-expansionistas. Capra enfatiza a interconexão de todos os fenômenos e a ordem implícita dessa interconexão, percebendo na articulação de valores emergentes a possibilidade de uma nova ordem social, em harmonia com os ciclos naturais. Os dois autores mostram consciência de serem suas obras profundamente políticas e, no entanto, também científicas, ainda que esta relação não seja facilmente compreensível sob a ótica da razão instrumental e do mecanicismo. A normatividade, para Capra, aparece sob a forma da experiência mística (sabedoria) e das descobertas da física subatômica . ambas colocando a consciência humana num contexto cosmológico, permitindo uma ação ao mesmo tempo/espaço integrada com a natureza e racional (percebendo padrões e contextos antes não percebidos pelo senso comum mecanicista). O autor escreveu mais tarde uma obra especificamente sobre a sabedoria, aprofundando sua tese de que há uma crise de percepção no núcleo da crise civilizatória (CAPRA, 1988). Para Ramos, a normatividade é sobretudo a recuperação da autonomia diante do mercado expansionista e a disposição para orientar-se socialmente no sentido da convivência catártica, evolutiva. Em obras escritas bem antes de A nova ciência das organizações este aspecto é enfatizado, conforme mostra a análise de Lucia Lippi Oliveira em A sociologia do Guerreiro (Oliveira, 1995). O conflito, para Ramos, é um gerador de estresse, e tem solução não só por meio da disposição política, mas sobretudo com a adequação de técnicas ecológicas de terapia, de meditação, etc. As diferenças entre os autores estão longe de ser radicais. Diferem apenas na ênfase . o que é notável, considerando-se suas formações e propósitos.

6. Tecnologia e Recursos Naturais

Este tema, intimamente associado ao da economia, é abordado pelos dois autores em profundidade. Aqui fica ainda mais evidenciada a tese de serem Capra e Ramos dois constituintes da ecologia política. Embora o ideário ecologista sobre tecnologias brandas fosse considerado utópico no início dos anos 80, ao contrário do que ocorre no início do século XXI entre governantes de países europeus (especialmente da Dinamarca e da Alemanha), os autores já convergiam naquele tempo quanto à defesa do uso da energia eólica ou solar. As tecnologias duras (pesadas), consideradas então como .normais., .únicas. ou .viáveis., foram criticadas por Capra e Ramos com base no paradigma emergente. Tais tecnologias estão vinculadas ao mecanicismo e à razão instrumental. .Embora., diz Capra, .as propriedades dos átomos tivessem sido estudadas mais por químicos do que por físicos durante o século XIX, a física clássica baseava-se na idéia newtoniana de que os átomos são os elementos básicos, duros e sólidos da matéria. Essa imagem contribuiu, sem dúvida, para a reputação da física como uma ciência pesada e para o desenvolvimento da tecnologia pesada baseada naquela. O irretorquível êxito da física newtoniana e a crença cartesiana na certeza do conhecimento científico levaram diretamente à ênfase que foi dada, em nossa cultura, à ciência e à tecnologia pesadas. Somente em meados do século XX tornar-se-ia claro que a idéia de uma tecnologia pesada era parte do paradigma cartesiano-newtoniano, um paradigma que seria superado. (CAPRA, 1982:63). Portanto, defender tecnologias de baixo impacto ambiental não é um sonho, mas uma questão de realismo científico. Ao contrário, defender tecnologia pesada é sonhar com uma impossibilidade prática, a da renovação de recursos nãorenováveis na escala de vida humana. Além disso, é defender a concentração de capital e de poder burocrático. Ramos percebe a íntima relação de todo cenário social com sua tecnologia adequada. Os fins de uma determinada organização (sistema social, cenário social) deveriam ser detidamente analisados e esclarecidos, e as tecnologias deveriam adequar-se a esses fins. É conhecido de todos os arquitetos sensíveis às formas ambientais o fato de que os grandes prédios de apartamentos contribuem com o desequilíbrio psíquico dos moradores. Muitos hospitais .modernos. também são exemplo de um caso extremo: sua linearidade, sua funcionalidade tecnocrática, seu afastamento do meio natural podem contribuir mais para a morbidez do que para a saúde ou rejuvenescimento. Ao bloquear a percepção destas questões, a racionalidade instrumental tornou-se inimiga não só da natureza dita .exterior. (rios, florestas, minerais), mas também da sociedade humana em geral. A racionalidade substantiva tem, portanto, um desafio bem mais complexo do que o de deter a loucura da utilização intensa de recursos não-renováveis. Faz-se necessário pensar as tecnologias ambientais em amplo sentido. Ponto significativo para os dois autores, principalmente para Ramos, é a questão do tamanho das instituições. Resumindo, ele defende que: a) .a capacidade de um cenário social para fazer face e para corresponder, eficazmente, às necessidades de seus membros, exige limites mínimos ou máximos a seu tamanho. Em outras palavras, cada cenário social tem um limite concreto de tamanho, abaixo ou acima do qual perde a capacidade de atingir eficazmente suas metas (por exemplo, a extração e o processamento de recursos) e de conseguir de seus membros o mínimo de consenso de que necessita para a própria preservação.; b) .Nenhuma norma geral pode ser formulada para determinar, com precisão, antecipadamente, o limite de tamanho de um cenário social; a questão do tamanho constitui sempre um problema concreto, a ser resolvido no próprio contexto.; c) .A intensidade das relações diretas entre os membros de um cenário social tende a declinar na proporção do aumento de seu tamanho. (RAMOS, 1981:159). A tecnologia em geral é pensada por Ramos com forte influência da microsociologia e da psicologia, enquanto que em Capra a tecnologia aparece como uma quantidade de inventos, uns coerentes com o paradigma mecanicista e outros com o sistêmico. Porém, os autores, como já foi dito, partem de pressupostos ecológicos inteiramente convergentes. Por isso, particularmente na questão da tecnologia, as duas obras são complementares. Assim poderíamos fazer muitas ilações sobre as características dos cenários sociais propostos por Ramos e as tecnologias ditas alternativas, de baixo impacto ambiental, relacionadas e analisadas por Capra. Este é um dos campos férteis para o desenvolvimento de teorias sociais com base no paradigma emergente. A confluência dos capítulos finais das duas obras, neste sentido, constitui uma admirável contribuição para o debate em torno do ecodesenvolvimento.

7. Espaço, Tempo, Psicologia e Pequenos Grupos

Um esforço de síntese das relações entre as duas obras sob esse tópico é tão relevante quanto difícil. É no mínimo arriscado dizer que os autores concordam com certa visão da psicologia sob o prisma do paradigma emergente. No entanto, percebe-se que os dois autores têm referenciais comuns. Carl Gustav Jung é o principal destes. Entretanto, para Capra, Gregory Bateson ( biólogo e geneticista, mas também pesquisador influente na antropologia e na psiquiatria) não é menos significativo do que Jung.

Considero que a crise paradigmática, que os autores enfrentaram na elaboração de suas obras, é algo muito perturbador em termos psicológicos. Por isso, é conveniente uma aproximação muito limitada em relação às idéias convergentes entre eles, que prevalecem sobre as divergentes de modo nítido. Um dos pontos básicos para Capra, tanto quanto para Ramos, é a não-separação entre espaço/tempo. Capra é muito convicto a esse respeito por dominar dados precisos constantes nas experiências da física moderna. A teoria da relatividade e a teoria quântica (e suas relações mútuas), por exemplo, constituem terrenos muito familiares para ele. A ponte estabelecida com o misticismo em O Tao da Física é fundamentada em O Ponto de Mutação com descobertas de vários psicólogos. O tempo é espaço e vice-versa para estes pesquisadores. Daí a valorização que Capra faz, tal como Ramos, da Dinâmica de Grupo, dos Grupos de Crescimento e da Convivência Catártica. A dimensão espacial-temporal é ampliada nessas experiências, permitindo uma integração com processos e ciclos naturais, além de uma percepção potencialmente mais crítica das circunstâncias opressoras e desequilibradas. Ramos identifica diversas faces ou tipos de tempo, como o serial, o convivial, o tempo de salto e o errante. O que ele chama de tempo de salto tem uma nítida convergência com o pensamento de Capra. Ramos conta que Soren Kierkegaard e Henri Bergson descreveram, ambos, um tipo de criativa experiência humana que só ocorre quando o indivíduo consegue romper os limites do social. A experiência envolve um salto do fechado para o aberto, das normas sufocantes que caracterizam uma era peculiar para dentro da eternidade. Especialmente em Kierkegaard, diz Ramos, o salto é equivalente à autodescoberta individual. .Lançando-se às profundezas a pessoa aprende a ajudar-se a si mesma. (Kierkegaard). Para Ramos, é óbvio que, em razão de seu caráter transocial, o conteúdo de saltos existenciais só pode ser articulado através da experiência simbólica. .Pode-se argumentar que o domínio da experiência simbólica é estranho à teoria organizacional, mas sustento que qualquer teoria organizacional que faça abstração da experiência simbólica deixa de desempenhar seu papel humanístico. A teoria organizacional verdadeiramente humanística tem de estar criticamente consciente de que os modelos sociais do homem são sempre categorias de conveniência. Mas a conveniência não é a única preocupação do conhecimento organizacional; este deve ter sensibilidade para aquilo que, no ser humano, não pode ser reduzido a termos sociais, de modo a impedir a fluidez da psique e sua deformação como simples espécime de episódica vida empresarial. Deve ser capaz de ajudar o indivíduo a manter um sadio equilíbrio entre as exigências de sua condição corporativa e sua vida interior. Dessa forma, o tempo serial precisa ser reconhecido por aquilo que é, e não tomado erroneamente por tudo aquilo que o tempo significa. (RAMOS, 1981:170). Em resumo, para Ramos os cenários sociais capazes de perdurar e contribuir com o desenvolvimento comunitário e individual dos cidadãos têm . necessariamente . tamanhos, tecnologias, espaço e tempo adequados, específicos. Capra questiona muitos aspectos do conceito mecanicista da mente, entre eles os principais, que são a separação entre mente e corpo, razão e intuição. A harmonia entre esses fatores é básica para o paradigma emergente. A noção de mente tem sido aprofundada até o ponto em que se considera o próprio ambiente natural uma forma ou dimensão do processo mental. Conforme as palavras de Capra:

“Na ordem estratificada da natureza, as mentes humanas individuais estão inseridas nas mentes mais vastas dos sistemas sociais e ecológicos, e estes, por sua vez, estão integrados no sistema mental planetário . a mente de Gaia ., o qual deve participar, finalmente, de alguma espécie de mente universal ou cósmica. Essa estrutura conceitual da nova abordagem sistêmica não é restringida, em absoluto, pela associação dessa mente cósmica à idéia tradicional de Deus. Nas palavras de Jantsch: 'Deus não é o criador, mas a mente do universo.. Nessa perspectiva, a deidade não é, evidentemente, masculina ou feminina, nem se manifesta em qualquer forma pessoal, mas representa nada menos que a dinâmica auto-organizadora do cosmos inteiro.” (CAPRA,1982:285)

As experiências descondicionantes (libertadoras) são vistas por Capra como parte do movimento social multifacetado que se espalha por todo o Planeta, dentro e fora das universidades, no sentido de minar o paradigma mecanicista. As experiências individuais ou grupais dão origem a formas de organização muito fluidas. Justamente devido a essa fluidez é que Capra não se detém, como Ramos, na formulação de sistemas sociais. Ele faz constantes referências às redes de comunicação, de produção e distribuição (mais tarde ele faria uma pesquisa específica sobre as redes que dão consistência aos partidos verdes, especialmente o PV alemão). No entanto, é correto inferir da relação entre as duas obras que as organizações pequenas, por sua dinamicidade, possibilidade de interação simbólica e adaptação aos contextos naturais . são parte indispensável do paradigma emergente. A socialização é vista pelos autores como necessária, porém muito perigosa, por implicar alienação da consciência cósmica. Esta tensão entre social e cósmico não é passível de ajustes políticos porque transcende a política. No entanto, a disposição política, alicerçada em valores pós-materialistas, pode contribuir decisivamente para a articulação social de pequenos grupos e indivíduos constituintes de um tecido social mais amplo. Percebe-se, assim, que para os dois autores a mudança social parte de um contato com o cósmico ou o .eu mais íntimo., considerados, de certa forma, o contexto do social emergente. Esta emergência, entretanto, requer qualificações, como a interação simbólica e afetiva, que uma multidão ou um grande aglomerado de pessoas torna inviável. Além disso, não há, aqui, a ilusão de juntar forças por meio de grupos que, somados, tornariam a sociedade um todo algo límpido e cristalino...

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os autores partem da crítica às sociedades industriais questionando, especialmente, a forma de racionalidade e os pressupostos da visão de mundo que lhes são subjacentes. Fazem uma avaliação negativa e um tanto unilateral do Iluminismo, deixando de perceber sua heterogeneidade interna e associando-o inteiramente às sociedades industriais. Karl Marx é um dos autores iluministas que divide as avaliações críticas de Capra e Ramos. As histórias do marxismo e do ambientalismo, contudo, são mais complexas do que as obras em questão permitem observar. Entretanto, não resta dúvida de que muitos autores ambientalistas são parcialmente herdeiros de Marx e, até certo ponto, estão entre seus mais argutos críticos. Este não é, contudo, o espaço apropriado para desenvolver uma reflexão aprofundada sobre o tema. Quanto aos demais tópicos, são claramente predominantes as convergências entre as obras e os autores. As diferenças, é verdade, não foram enfatizadas, tendo sido escolhidos temas que permitissem mostrar as semelhanças apesar das diferentes formações acadêmicas. Parece claro que os aspectos epistemológicos permeiam vários destes tópicos temáticos. Isto, até certo ponto, é inevitável, já que o ideário ambientalista, à margem do paradigma monodisciplinar ou disjuntor-redutor, apóia-se em diversas áreas do conhecimento e tende a atravessá-las transversalmente. Uma percepção neste sentido pode ser facilitada por uma síntese comparativa em forma de tabela, que é apresentada a seguir:

(...)

Tomando as duas obras em conjunto, caberia questionar, no início do século XXI: até que ponto Ramos e Capra transcenderam sua época nos escritos considerados, aqui, clássicos da ecologia política? Neste sentido, pode-se argumentar que as duas obras anteciparam-se, até certo ponto, ao Fim da Guerra Fria e à despolarização ideológica entre liberalismo e socialismo. Os autores não se aliam nem à esquerda nem à direita do espectro político-ideológico. Estão, por assim dizer, à frente de ambas as correntes, na medida em que buscam algo como uma .terceira via., para usar uma expressão cara a Anthony Giddens (1996; 1999). Entretanto, suas reflexões não focalizaram detidamente as possíveis alternativas ao Estado de Bem-Estar (estatal-democracia) e ao neoliberalismo e, neste sentido, foram insuficientemente politizadas. A globalização dos mercados tem tido conseqüências contraditórias e complexas, gerando predominantemente no curto prazo uma expansão da histórica desigualdade socioeconômica entre os hemisférios Norte e Sul e, assim, suas propostas a respeito de uma economia dual parecem um tanto idealistas. A relação entre o pensamento econômico e o ecopolítico carece, sem dúvida, de análises mais apuradas, para que se chegue a propostas mais realistas (Hawken et al, 2000). Entretanto, no que se refere aos princípios normativos, as obras em questão continuam tendo seu valor. As Agendas 21 locais, regionais, nacionais, por exemplo, tendem a agregar propostas de setores isolados, carecendo de visão estratégica. Esta é possível a partir de uma compreensão dos princípios normativos da ecologia política. Por outras palavras, o paradigma social emergente pode apoiar-se nas contribuições que fazem emergir o novo paradigma científico (e vice-versa).
A revolução digital tem reorientado as sociedades industriais com crescente aceleração do tempo histórico e desterritorialização desde pelo menos a primeira metade dos anos 80. E a interconexão generalizada entre as várias instâncias das sociedades, dos setores produtivos e do consumo, a forte fluidez das individualidades sob uma radical pressão socializadora do mercado, têm confirmado as análises e expectativas tanto de Capra quanto de Ramos. Com efeito, no que se refere à relação entre ética, ecologia, psicologia e adequação das tecnologias, as duas obras aqui comparadas mantêm-se plenamente atuais, enquanto referencial teórico. Conforme sustentei em outro artigo (BOEIRA, 1998), o modo de vida reticular que se impõe com a revolução digital não é necessariamente destrutivo nem construtivo, mas crísico, porque dinamiza os conflitos paradigmáticos e provoca (não determina, apenas suscita, instiga) experiências do que Alberoni (1991) chamou de .estado nascente.. O ambientalismo, que se tornou multissetorial (VIOLA, 1992), institucionalizouse na década de 1990, não conseguindo romper o setorialismo burocrático-mercantil, ainda que tenha feito avanços consideráveis com a noção de sustentabilidade em suas múltiplas dimensões. A emergência de uma percepção sistêmica e de uma razão substantiva no processo de implementação do desenvolvimento sustentável poderia conduzir a um renascimento do ambientalismo, sob a forma transetorial, ou mesmo pressupor tal radicalização pela complexidade. De qualquer modo, estas questões e hipóteses põem novamente em relevo os valores, os aspectos epistemológicos e a sensibilidade política de longo prazo de Fritjof Capra e de Guerreiro Ramos.

BIBLIOGRAFIA

ALBERONI, F. Gênese. Como se criam os mitos, os valores e as instituições da civilização ocidental. Rio de Janeiro, Rocco, 1991.

ALIER, J. M. & SCHLÜPMANN, K. La ecología y la economia. México, Fondo de Cultura Económica, 1991.

BATESON, G. Mente e natureza: a unidade necessária. Rio de Janeiro, Francisco Alves, 1986.

BERTALANFFY, L. v. Teoria geral dos sistemas. 2a ed. Vozes/MEC, 1968.

BOULDING, K. Ecodinamic. A new theory of societal evolution. London, Sage, 1978.

BOEIRA, S. L. .Marxismo analítico & funcionalismo.. Revista de Ciências Humanas.
CFH; Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, vol. 14, n.20, p.934, 1996.

..... .Crise civilizatória e ambientalismo transetorial.. Revista de Ciências Humanas, CFH, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, vol. 16, n.
23, p. 71-102, 1998.

BROWN, L. Por uma sociedade viável. Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1983.

BUCKLEY, W. A sociologia e a moderna teoria dos sistemas. São Paulo, Cultrix, 1967.

BUNGE, M. Ciência e desenvolvimento. São Paulo, ed. da USP, 1980.
CAPRA, F. et al. Gerenciamento ecológico. Guia do Instituto de Auditoria Ecológica e Negócios Sustentáveis. São Paulo, Cultrix, 1993.

CAPRA, F. O ponto de mutação. A ciência, a sociedade e a cultura emergente. São Paulo, Cultrix, 1982.

..... A teia da vida. Uma nova compreensão científica dos sistemas vivos.
São Paulo, Cultrix, 1996.

..... O tao da física . um paralelo entre a física moderna e o misticismo oriental. 2a ed., São Paulo, Cultrix, 1983.

..... Sabedoria incomum. São Paulo, Cultrix, 1988.

CASTORIADIS, C. & COHN-BENDIT, D. Da ecologia à autonomia. São Paulo, Brasiliense, 1981.

COMMONER, B. Energias alternativas. Barcelona, Gedisa, 1980.

DALY, H. Steady state economics. San Francisco, N.H. Freeman Co., 1977.

DEUTSCH, K. W. Eco-social systems and eco-politics. Paris, Unesco, 1977.

DORST, J. Antes que a natureza morra. Por uma ecologia política. São Paulo, Edgard Blücher Ltda, 1973.

DUPUY, J-P. Introdução à crítica da ecología política. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 1980.

EHRLICH, P. The population bomb. Stanford University Press, 1968.

GALTUNG, J. Self-reliance. A strategy for development. London, Bogle-Lóuverture, 1977.

GARAUDY, R. Appel aux vivants. Editions du Seuil, 1979.

GEORGESCU-ROEGEN, N. The entropy law and the economic process. Cambridge, London, Harvard University Press, 1971.

GIDDENS, A. A terceira via. Reflexões sobre o impasse político atual e o futuro da social-democracia. Rio de Janeiro, Record, 1999.

..... Para além da esquerda e da direita. O futuro da política radical. São Paulo, Editora Unesp, 1996.

GORZ, A. Adieux au prolétariat. Editions Galilée, 1980.

HAWKEN, P. et al. Capitalismo natural. Criando a próxima revolução industrial.
São Paulo, Cultrix, 2000.

ILLICH, I. A convivencialidade. Lisboa, Europa-America, 1976.

INGLEHART, R. The silent revolution. Changing values and political styles among western publics. Princeton University Press, 1977.

KUHN, T. The structure of scientific revolutions. University of Chicago Press, 1962. LEFF, E. Ecología y capital. Racionalidad ambiental, democracia participativa y desarrollo sustentable. 2ª ed. Universidad Autónoma de México, 1994.

LEIS, H. R. A modernidade insustentável. As críticas do ambientalismo à sociedade contemporânea. Petrópolis, Vozes/Edufsc, 1999.

MANHEIM, K. Men and society in age of reconstruction. New York, Harcout, Brace & World, 1940.

McCORMICK, J. Rumo ao paraíso. A história do movimento ambientalista. Rio de Janeiro, 1992.

MILBRATH, L. Environmentalism. Vanguard for a new society. Albany, State University of New York Press, 1984.

MONTIBELLER-FILHO, G. O mito do desenvolvimento sustentável. Meio ambiente e custos sociais no moderno sistema produtor de mercadorias. Florianópolis, Editora da UFSC, 2001.

MORIN, E. & KERN, A. Terra-pátria. Porto Alegre, Sulina, 1996.

MORIN, E. Le paradigme perdu: la nature humaine. Editions du Seuil, 1973.

..... O método. Vol IV. As idéias: sua natureza, vida, habitat e organização.
Lisboa, Publicações Europa-América, 1991.

OLIVEIRA, L. L. A sociologia do Guerreiro. Rio de Janeiro, UFRJ, 1995.

OPHULS, W. Ecology and politics of scarcity. San Francisco, Freeman, 1977.

PÁDUA, J. A. (Org.) Ecologia & política no Brasil. Rio de Janeiro, co-edição Espaço e Tempo e IUPERJ, 1987.

RAMOS, A. G. A nova ciência das organizações. Uma reconceituação da riqueza
nas nações. Rio de Janeiro, Fundação Getúlio Vargas, 1981.

..... A redução sociológica. 3a ed. Rio de Janeiro, Editora UFRJ, 1996.

ROUANET, S. P. As razões do iluminismo. São Paulo, Cia da Letras, 1987.

SACHS, I. Ecodesenvolvimento . crescer sem destruir. São Paulo, Vértice, 1986a.
..... Espaços, tempos e estratégias do desenvolvimento. São Paulo, Vértice, 1986b.

SCHUMACHER, E.F. O negócio é ser pequeno 4a ed. Rio de Janeiro. Zahar Edito
res, 1983.

TOYNBEE, A. O desafio do nosso tempo. Rio de Janeiro, Zahar, 1979.

VIOLA, E. .O movimento ecológico no Brasil (1974-1986): do ambientalismo à
ecopolítica.. In: PÁDUA, J. (Org.) Ecologia & política no Brasil. Rio de Janeiro, co-edição Espaço e Tempo e IUPERJ, 1987;

..... .O movimento ambientalista no Brasil (1971-1991): da denúncia e
conscientização pública para a institucionalização e o desenvolvimento sustentável.. In: GOLDENBERG, M. (Org.). Ecologia, ciência e política. Rio de
Janeiro, Revan, 1992.


[1] Uma lista mais abrangente e também mais específica por área disciplinar de origem encontra-se em Viola, E.(1987)

[2] O preservacionismo caracteriza-se pela preservação da natureza com forte desconfiança em relação à ação humana (biocentrismo), enquanto o conservacionismo representa a defesa de princípios racionais no uso dos recursos naturais, a prevenção do desperdício e o desenvolvimento dos ecossistemas para a maioria dos cidadãos(relativo antropocentrismo). Para mais detalhes, ver Leis, H. (1999: 53-66 e McCormick, 1992)

[3] Uma primeira versão deste trabalho foi escrita como exercício acadêmico após a disciplina Teoria Social Contemporânea, ministrada pelo professor Eduardo Viola no Mestrado em Sociologia Política (1986/2, UFSC)

[4] Rouanet observa que mesmo autores como Albrech Wellmer e Jürgen Habermas, que proclamam sua filiação ao Iuminismo, não têm uma teoria sistemática do mesmo. O autor propôs o uso do termo .Iluminismo. para designar uma tendência intelectual, não limitada a qualquer época, que combate o mito e o poder, a partir da razão. O Iluminismo assim compreendido cruzaria transversalmente a história, tendo sido atualizado na Ilustração, sem ter começado com ela e sem se extinguir no século XVIII. (ROUANET, 1987: 28, 29)

[5] Para uma análise da relação entre marxismo e economia ecológica, ver ALIER & SCHLÜPMANN, 1991: 253-285, e sobre ecomarxismo ver LEFF, 1994 e MONTIBELLER-FILHO, 2001. Para uma discussão ecopolítica do marxismo analítico e do funcionalismo, ver BOEIRA, 1996.